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O brasileiro que vende celulares chineses para a América Latina

Hugo Barra, vice-presidente da Xiaomi, participa de coletiva de imprensa sobre lançamento de Mi phones - Anindito Mukherjee/Reuters
Hugo Barra, vice-presidente da Xiaomi, participa de coletiva de imprensa sobre lançamento de Mi phones Imagem: Anindito Mukherjee/Reuters

06/07/2015 07h48

O mercado brasileiro está cheio de produtos fabricados na China, mas, na Santa Ifigênia, rua no centro de São Paulo conhecida por suas lojas de eletrônicos, os consumidores costumam torcer o nariz para as marcas chinesas.

"A primeira coisa que vem à cabeça quando você fala 'produto chinês' é se tratar de uma mercadoria de pouca qualidade e provavelmente contrabandeada. Eu os evitaria", diz um comerciante.

Existe até mesmo um termo pejorativo para as marcas chinesas que tentam competir ou imitar marcas mais renomadas: "xing ling".

Ainda assim, este foi o mercado escolhido pela fabricante chinesa Xiaomi para começar a vender smartphones fora da Ásia.

A empresa, que, apesar de ser a terceira maior fabricante de smartphones do mundo ainda é desconhecida fora do continente asiático, anunciou sua chegada ao mercado brasileiro na última quarta-feira - as vendas começam no dia 7 de julho, por meio de seu site.

Liderando esta "invasão" chinesa está um executivo brasileiro, Hugo Barra, vice-presidente para operações internacionais da companhia.

Barra é um exemplo raro de um latino-americano no comando de uma empresa chinesa. Formado em Ciência da Computação e Engenharia Elétrica pelo Massachussetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, o executivo de 38 anos fez carreira em Londres, no Reino Unido, e no mercado americano.

De 2008 a 2013, trabalhou no Google, onde desempenhou um papel-chave no desenvolvimento do sistema operacional para smartphones Android.

Mas, há dois anos, ele surpreendeu o Vale do Silício ao se mudar para uma start-up chinesa criada pelo bilionário Lei Jun.

A aposta parece estar dando certo. Sob a liderança de Barra, a Xiaomi se estabeleceu como uma grande fabricante deste setor, com 60 milhões de smartphones vendidos no ano passado.

América Latina

Para sua primeira empreitada no Ocidente, a companhia, em vez de optar por Europa e Estados Unidos, escolheu o Brasil, que servirá como porta de entrada para um mercado ainda maior.

"A América Latina como um todo representa uma tremenda oportunidade", disse Barra à BBC no mês passado.

"É um mercado muito grande onde as pessoas estão rapidamente substituindo seus celulares comuns por seu primeiro smartphone."

Os números dão uma ideia da força deste mercado. A economia brasileira cresceu apenas 0,1% no ano passado, mas as vendas de smartphone saltaram 55%.

Atualmente, o Brasil é o quarto maior mercado de celulares do mundo, depois da China, dos Estados Unidos e da Índia.

Nos mercados europeu ou americano a Xiaomi teria de convencer consumidores a abrir mão das marcas que usam hoje; mas, no latino-americano, a empresa quer vender para quem está comprando seu primeiro celular inteligente.

Pesquisas indicam que 45% dos consumidores no Brasil ainda não têm um smartphone.

A Xiaomi tem planos de expansão para mercados desenvolvidos, mas isso dependerá de seu desempenho no Brasil e também no México, sua próxima parada na região.

Uma de suas grandes armas é o preço competitivo; vendendo seus produtos com o que chama de "preço justo" - normalmente, bem abaixo dos preços de marcas rivais - a Xiaomi conseguiu a participação de mercado que têm hoje em países asiáticos.

Na Índia, onde 41% do mercado de smartphones é dominado por fabricantes menos conhecidas, esta estratégia está funcionando bem.

Mas no Brasil há outros desafios. Os brasileiros gostam das grandes marcas. Apenas seis delas - Apple, LG, Microsoft, Motorola, Samsung e Sony - respondem por mais de 95% das vendas.

"Xiaomi precisará roubar participação de mercado destas marcas globais, que estão presentes no país nos últimos dez anos", diz Leonardo Munin, analista da consultoria IDC Brasil.

Outro desafio, ele diz, é que as vendas online não são tão volumosas no Brasil quanto na Ásia.

Só 15% dos smartphones são comprados pela internet no Brasil - e, por enquanto, a empresa pretende vender exclusivamente pela internet, mantendo-se fora do setor de varejo.

Desconhecidas

A companhia faz parte de uma série de marcas chinesas, como a Alibaba, que têm forte presença no Oriente mas são desconhecidas nos mercados ocidentais.

Barra diz que a Xiaomi é diferente de outras empresas, porque opta em manter controle sobre várias etapas de produção e comercialização.

Ele a descreve como uma mistura de diversas companhias. Produz aparelhos, como a Apple. Desenvolveu seu próprio sistema operacional baseado no Android, como o Google. E dedica boa parte de seus esforços para as vendas online e a logística, como a Amazon.

A Xiaomi cresceu sob o comando de um executivo muito bem-sucedido no Vale do Silício.

O próximo desafio de Barra será ganhar consumidores em seu próprio país.