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'As mídias sociais entristecem e queremos mudar isso', diz Orkut sobre nova rede

Orkut Büyükkökten deixou o Google em 2014 para criar sua nova rede social, a Hello - Hello
Orkut Büyükkökten deixou o Google em 2014 para criar sua nova rede social, a Hello Imagem: Hello

Rafael Barifouse

BBC Brasil, Sao Paulo

29/06/2016 08h23

Há 12 anos, o engenheiro turco Orkut Büyükkökten ficou famoso no Brasil ao emprestar seu nome para o site que popularizou no país o conceito de mídia social. Agora, ele está de volta com uma nova - e ambiciosa - empreitada na área: a rede social Hello, que chega ao Brasil em julho.

A Hello foi apresentada oficialmente na semana passada como uma rede para fazer e manter "amizades profundas" com outras pessoas com base em interesses e paixões mútuos e onde o "medo e o ódio não têm vez".

É a forma como o criador do Orkut acredita poder ajudar a resolver uma questão que vem afastando algumas pessoas desse tipo de serviço. Ainda que persista a pergunta: há espaço para mais uma rede social entre os usuários de internet?

"Desde que lançamos o Orkut, as redes sociais evoluíram muito, mas nem sempre de uma forma boa. Estudos mostram que, hoje, elas deixam muita gente triste ou ansiosa", opina Büyükkökten em entrevista à BBC Brasil.

"Uma pessoa usa o Facebook pensando na forma como quer ser percebida publicamente, interage com os outros tentando passar uma certa imagem, mas isso não é autêntico nem divertido. Queremos mudar isso e ser a próxima geração das redes sociais."

O engenheiro dá o exemplo de um casal de amigos que está se divorciando, mas publicou recentemente um post em que pareciam bastante felizes em um piquenique no parque.

"Ao mesmo tempo, ver essa 'vida feliz' dos outros nos deixa com medo de estarmos perdendo algo em nossas próprias vidas. Uma rede social não pode ter esses efeitos. Ela deveria tirar o melhor das pessoas."

Personalidade, interesses e pontos

Ao criar perfil, usuário responde questionário e indica seus principais interesses - Hello - Hello
Ao criar perfil, usuário responde questionário e indica seus principais interesses
Imagem: Hello

A forma de fazer isso, segundo ele, é gerar conexões entre as pessoas com base no que elas mais gostam. Seja entre amigos e conhecidos ou entre quem ainda não se conhece.

Ao criar seu perfil, o usuário responde a um questionário com 60 perguntas para identificar sua personalidade e depois elege os cinco assuntos que mais lhe interessam.

Há uma lista com cem possibilidades, que vão desde itens corriqueiros, como ser apaixonado por cães ou esportes, até outros mais incomuns, como gostar de nudismo, striptease ou "observar pessoas".

Isso determina o tipo de publicações que serão vistas por um membro da rede social. As características pessoais e interesses podem ser atualizados ao longo do tempo.

O usuário ainda ganha pontos, chamados "moedas Hello", ao gerar conteúdo próprio - texto ou fotos - e ao conquistar curtidas e comentários em seus posts.

Esses pontos podem ser acumulados - ou comprados - para elevar a categoria ou nível de um perfil, como ocorre com um personagem de videogame, ampliar o alcance de uma publicação ou ainda postar anonimamente.

Membros acumulam pontos, que podem ser usados para publicar post anônimo - Hello - Hello
Membros acumulam pontos, que podem ser usados para publicar post anônimo
Imagem: Hello

Desde o Orkut, diz Büyükkökten, as redes sociais passaram por muitas mudanças - e uma das principais é a forma de acesso, que ocorre cada vez mais exclusivamente pelo celular.

Por isso, em sua segunda incursão neste universo, o engenheiro criou um serviço que não pode ser acessado por navegadores, mas só por meio do aplicativo, disponível para iOS e Android.

Concorrência

Ao mesmo tempo, ao longo dos últimos 12 anos, surgiram uma série de novas redes sociais. Haveria espaço para mais uma?

"Realmente, há uma fadiga quanto às redes sociais. As pessoas se inscrevem em diferentes serviços por diferentes motivos, e estar em tantas delas ao mesmo tempo gera um cansaço", afirma o engenheiro.

"Não esperamos que as pessoas parem de usar as outras, mas que usem o nosso serviço cada vez mais, porque, ao atualizar suas características pessoais ao longo do tempo, isso mudará sua experiência individual, e a rede social vai evoluir com você. Não será preciso substituir um serviço por outro conforme seu estilo de vida muda."

Raquel Recuero, pesquisadora em mídia social e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e da Universidade Católica de Pelotas, acredita que pode haver espaço para a Hello.

"Hoje, existe um certo ranço do Facebook, que se universalizou demais. Há gerações mais novas que usam cada vez menos", afirma a pesquisadora. "Ao mesmo tempo, nos últimos tempos, alguns malefícios ficaram mais aparentes no Brasil, como pessoas que se expuseram demais ou brigaram com a família ou amigos (por conta de postagens)."

Volta às origens e anonimato

Hello só tem versão para ser acessada por meio de aplicativo para celulares - Hello - Hello
Hello só tem versão para ser acessada por meio de aplicativo para celulares
Imagem: Hello

Recuero considera "interessante" a proposta da Hello e vê nela um resgate de algumas características da primeira rede social lançada por seu criador.

"As comunidades do Orkut já eram lugares para achar pessoas com interesses em comum, mas depois seu uso foi sendo modificado pelo usuário para mostrar características pessoais suas. Também havia um aspecto de game ao poder avaliar os outros com corações para dizer se a pessoa era sexy ou com gelinhos para dizer se ela era 'cool'", diz Recuero.

"Pode ser uma volta à ideia original, só que melhorada. Mas, no fundo, atende uma característica fundamental do ser humano, porque adoramos encontrar pessoas que gostam do que também gostamos."

No entanto, outras redes sociais onde usuários podiam fazer publicações sem revelar sua identidade fracassaram diante da chuva de críticas e reclamações sobre comentários ofensivos.

Recuero concorda que o anonimato pode ser um incentivo à publicação de discursos de ódio e à propagação de diversos tipos de preconceito.

"É um recurso para uma pessoa se esconder ao expressar opiniões radicais, e isso pode ser perigoso, mas tudo depende da forma como esse recurso será usado", diz Raquel Recuero, pesquisadora e professora do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Büyükkökten diz não estar preocupado com isso. "Sem ter uma opção para expressar uma opinião impopular sem medo de represália, os usuários acabam criando outras contas com identidades falsas que entopem o sistema", afirma.

"Se posts anônimos tiverem agressões ou mensagens de ódio, a comunidade pode denunciá-lo para impedir que se propague. Isso reduz a reputação de quem publica e afeta como o conteúdo postado por essa pessoa será distribuído no futuro."

Brasileiros e redes sociais

A nova rede social já está disponível em cinco países de língua inglesa - Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Irlanda e Reino Unido.

Em breve, estará disponível em outros países (e idiomas), como França, Alemanha, México e também no Brasil, onde será lançado no próximo mês, segundo seu criador, e não em agosto, como indicado no site da rede social.

"Isso exige um esforço muito grande, porque existem centenas de milhares de verbos e expressões em cada língua, e queremos garantir que temos a melhor tradução possível."

Büyükkökten diz ter ficado "honrado" com a repercussão entre os brasileiros do lançamento de sua nova rede social nos país, que consta com frequência nas listas dos que mais usam redes sociais no mundo.

"A cultura brasileira é por si própria muito social, então, acho que é por causa disso que há uma alta adoção desse tipo de site pelos brasileiros. Não vamos decepcionar vocês."