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Com design espetacular, Surface da Microsoft traz Windows como principal ponto negativo

David Pogue

Do New York Times

26/10/2012 06h01Atualizada em 26/10/2012 17h43

Você gostaria de se mudar para uma mansão maravilhosa em um penhasco com vista para o mar - na Somália? Ou gostaria de possuir uma nova Ferrari - que tem de ser reabastecida a cada 5 quilômetros? Você aceitaria um emprego que paga US$ 1 milhão por ano - para cortar a grama de campos de futebol com cortadores de unha?

Esse é o tipo de opção que a Microsoft está pedindo que você faça com o muito polêmico tablet Surface, que tem um design espetacular.
Ora, para o primeiro tablet que jamais fabricou (na verdade seu primeiro computador), a Microsoft poderia apenas ter feito outra cópia do iPad. Mas ela visou muito mais alto. Quis produzir um tablet que é tão bom para criar trabalho quanto para organizá-lo.

No quesito hardware, a Microsoft teve um grande sucesso. Leia as especificações e tente não babar no seu teclado.

O Surface compartilha algumas medidas com o iPad (0,680 kg, 1 cm de espessura). Mas com 27,4 x 17 cm é um retângulo mais comprido e fino, um formato melhor para assistir a filmes. Ele tem alto-falantes estéreo em vez de mono. As câmeras de vídeo são de alta definição, com 720p.

  • Divulgação

    É irônico que entre um ponto negativo do Surface tem relação com a suposta especialidade da Microsoft: o software

Ele tem portas e tomadas com que os donos de iPad só podem sonhar: um slot para cartão de memória para aumentar o armazenamento, uma tomada de saída de vídeo e uma USB 2.0. Você pode conectar quase qualquer equipamento USB: teclado, mouse, flash drive, alto-falantes, disco rígido e assim por diante.

Cada modelo Surface tem o dobro do armazenamento do iPad do mesmo preço. Por exemplo, o Surface de US$ 500 oferece 32 GB; o Surface de 64 GB custa US$ 600.

Mas há algumas decepções na ficha de especificações. A vida da bateria é anunciada como de 8 a 10 horas - menos que o iPad. Não há versão para celular; é só Wi-Fi. A tela é muito nítida (1.336 por 768 pixels), mas não chega perto da clareza da tela Retina do iPad (2.048 por 1.536 pixels).

E você só pode recarregar o Surface com seu adaptador de tomada - não em uma saída USB do computador. O raciocínio da Microsoft é que você não terá um computador para recarregá-lo, já que seus dias de levar um tablet e um laptop terminaram. Além disso, uma tomada de parede recarrega muito mais depressa que um USB.

A frente inteira é uma tela de toque. As bordas do corpo de magnésio preto são angulosas e firmes, como um utensílio de um filme de Batman.
Depois há o suporte. A metade inferior do verso do Surface é um painel com dobradiça, que fica fechado com ímã até que você o puxa com a unha. Ele abre até um ângulo de 22 graus, pronto para manter o tablet firmemente erguido.

Outro suporte poderia aumentar o peso, o volume ou a feiúra. Mas este é fino como uma lâmina e desaparece completamente quando você não o está usando.

Mas você o usa, especialmente quando abre o teclado opcional.

Sim, teclado. Você conhece a capa com dobradiças magnéticas do iPad? A Touch Cover da Microsoft é a mesma ideia - a mesma dobradiça magnética -, exceto que no interior há formas de teclas, e até um trackpad, feito de um material ligeiramente elevado e áspero. Abra a capa, abra o suporte e pronto: você tem um PC de 700 gramas que cabe em qualquer lugar.

Não é como aqueles estojos de teclado Bluetooth para o iPad. Primeiro, a Touch Cover é muito mais fina, com 0,33 cm; parece uma cartolina. Segundo, não é Bluetooth; não há setup nem bateria. O ímã faz clique e o teclado está pronto para digitar. Terceiro, quando você quer apenas um tablet, o teclado gira e fica escondido atrás dele. O Surface automaticamente desabilita as teclas e exibe o teclado na tela quando é preciso digitar.

Você pode comprar essa capa em diversas cores junto com o Surface por US$ 100, ou mais tarde por US$ 120.

É uma ideia incrivelmente esperta, mas as teclas não se movem. Você digita em uma superfície plana. Se você digitar depressa demais o teclado salta letras. ("Se você digita 80 palavras por minuto em um teclado e 20 a 30 no vidro, deverá ficar por volta de 50 na Touch Cover", diz um representante da Microsoft.)

Felizmente, a Microsoft também oferece o Type Cover (US$ 130), com teclas reais que realmente afundam. Com 0,61 cm de espessura, não é tão imperceptível quanto a Touch Cover, mas a Microsoft diz que é o teclado com teclas móveis mais fino do mundo, e ele digita muito bem.
Então esse é o maravilhoso hardware. Agora a decepção: o software.

Versão do Windows 8

Esse computador roda Windows RT, uma variação do Windows 8, que a Microsoft espera que rode em todos os PCs de agora em diante. O RT é totalmente diferente dos antigos Windows. Você ficará entusiasmado ou desanimado, dependendo de como aprecia as mudanças.

Neste Windows, a tela Iniciar é uma colcha de retalhos de quadrados coloridos e interativos. Você encosta em um deles para abrir um aplicativo, desliza o dedo para baixo para "clicar com o botão direito", desliza na horizontal para revelar mais páginas de apps. Cada quadrado também é um pequeno painel que mostra seu próximo compromisso, a última postagem no Facebook, o tempo hoje e assim por diante. É rápido, fluido e divertido de usar.

Deslizando o dedo das bordas da tela para o centro aparecem diversos painéis ocultos. Deslize do alto ou de baixo para revelar seus menus de aplicativos; a partir da esquerda para mudar de app; da direita para controles importantes como Compartilhar e Configurações.
Infelizmente, o Windows RT não é o Windows completo. O Surface vem com versões experimentais 2013 de Word, Excel e PowerPoint - que funcionam, mas às vezes são lentas.

De outro modo, porém, o Windows RT não pode rodar nenhum dos 4 milhões de programas regulares do Windows. Ou os 275 mil apps do iPad. Ou os 17 apps de tablets Android. (É brincadeira! Na verdade existem 19 apps de tablet Android.)

Em vez disso, ele exige todos os apps novos. Eles estão disponíveis exclusivamente na Windows App Store, e não há muitos para escolher; por exemplo, não há apps para Facebook, Spotify, Angry Birds, Instagram, Draw Something ou New York Times. O total nos EUA é de aproximadamente 3.500 até agora; muitos são fracos ou lixo.

Surface Pro

De certa maneira, a perspectiva mais intrigante é o tablet Surface Pro, que a Microsoft diz que estará disponível em 90 dias. Ele tem um verdadeiro chip Intel lá dentro e pode rodar verdadeiros programas Windows. Isso mesmo: Photoshop, iTunes, Quicken e jogos clássicos para PC em seu tablet.

O Pro será mais pesado (0,907 kg), mais grosso (1,27 cm) e muito mais caro (por volta de US$ 1 mil). Por esses sacrifícios, é claro, você poderia comprar um laptop ultra fina - mas a capa teclado do Surface e a tela de toque o tornam muito mais flexível.

Mas os dois tablets Surface, e de fato o próprio Windows 8, sofrem de dupla personalidade, uma confusão terrível. Por baixo do mundo colorido de aplicativos RT, os menus, ícones, barra de tarefas e janelas sobrepostas do desktop tradicional do Windows continuam lá. No Surface, aquele antigo desktop surge surpreendente e desnecessariamente sempre que você usa os programas do Office.

Isso não é tudo o que há de errado com o Windows RT. Não há reconhecimento de voz, quanto menos Siri; nem pastas de aplicativos; nem orientação automática em Mapas. O painel de controle oferece características como sugestões de digitação e autocorreção, mas eu não consegui fazê-los funcionar. Às vezes o teclado on-screen não aparece quando deveria.

Pequenas inconsistências e decepções estão em toda parte. Por exemplo, o modo como o Word constantemente me informa sobre "Memória ou espaço em disco insuficiente". (Bem, puxa, Microsoft... de quem é a culpa?)

Veja, o negócio é este. Você teria de ter muito sangue-frio para manter a calma na primeira vez em que vê o Surface: sua beleza, seu potencial, sua transformação imediata de tablet em PC. É incrível que esse design ousado de envelope veio da Microsoft, uma companhia que durante anos só produziu fracas imitações das ideias de outras empresas.

E é irônico que o que vai contra o Surface é supostamente a especialidade da Microsoft: o software.

Com o tempo talvez surjam mais apps para o Windows RT. Talvez os problemas sejam reparados. Talvez as pessoas solucionem o quebra-cabeça superposto de Windows RT e Windows 8. Até então, o Surface é uma máquina de concepção brilhante, com hardware de tirar o fôlego - mas com um software que esgota a paciência.