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Pokémon vira o mais novo inimigo do governo da Indonésia

REUTERS/Sam Mircovich
Imagem: REUTERS/Sam Mircovich

Joe Cochrane

Em Jacarta, Indonésia

21/07/2016 06h00

As autoridades indonésias, envolvidas em uma disputa com Pequim no Mar do Sul da China, e brigando com a Austrália a respeito de barcos de imigrantes, estão alertando para outra questão urgente: Pokémon.

Oficiais do governo, incluindo líderes das forças de segurança do país, estão avisando que o Pokémon Go, o novo e mundialmente popular jogo de celular que usa o sistema de GPS, é uma ameaça nacional que poderia permitir que seus inimigos tenham acesso a informações ultrassecretas e penetrem sites governamentais e militares delicados.

"Como o jogo usa uma câmera em tempo real, haverá riscos de segurança quando jogado" perto ou dentro de instalações governamentais restritas, disse Sutiyoso, o diretor da Agência Estatal de Inteligência, o serviço de espionagem interno, a repórteres na sexta-feira. Assim como muitos indonésios, ele tem somente um nome.

Manifestando preocupações similares, Yuddy Chrisnandi, diretor do Ministério da Reforma Administrativa e Burocrática, através de sua conta no Twitter proibiu todos os servidores públicos de jogarem Pokémon Go durante o trabalho dentro de prédios do governo. Ele disse que isso poderia comprometer segredos de Estado.

Líderes das Forças Armadas da Indonésia e da Polícia Nacional também proibiram seus membros de jogar durante o trabalho, chamando-o de ameaça à segurança, de acordo com notícias locais.

Antes disso, um alerta que circulou entre as Forças Armadas indonésias e a Polícia Nacional alegava que a Agência Nacional de Informação Geoespacial dos EUA estava usando o jogo como um “sistema de coleta de dados”, de acordo com o “The Jakarta Globe”, uma publicação online em inglês.

O alerta que vazou, de acordo com a publicação, afirmava que a CIA havia feito o mesmo com o Facebook.

Juwono Sudarsono, um ex-ministro da Defesa indonésio, questionou as alegações, dizendo que a Agência Nacional de Informação Geoespacial “dificilmente gastaria bilhões para espionar a Indonésia”, com quem Washington mantém fortes relações diplomáticas, econômicas e de segurança.

Os duros alertas tiveram pouco efeito sobre outros oficiais do governo. Pramono Anung, secretário de gabinete para o presidente Joko Widodo, contou alegremente a repórteres na semana passada que havia capturado alguns pokémons enquanto jogava na área do palácio presidencial em Jacarta, a capital. A Associated Press relatou na quarta-feira que havia sido proibido jogar Pokémon Go na área do palácio.

Além disso, o governador da cidade, Basuki Tjahaja Purnama, sugeriu a realização de um evento onde jogadores de Pokémon Go fossem jogar dentro da sede da prefeitura, para ajudar a promover o turismo.

O Pokémon Go não foi oficialmente introduzido na Indonésia, o que quer dizer que os jogadores no país estão usando aplicativos não autorizados para jogar —inclusive os oficiais do governo.

Alguns especialistas em segurança e analistas duvidam que o jogo seja uma ameaça à segurança nacional. Em vez disso, eles apontam para a xenofobia por parte das forças de segurança da Indonésia que vem desde a independência do país da colonização holandesa em 1945.

“É a mentalidade dos militares em si, uma vez que eles não entendem o que o Pokémon realmente é, e nem a tecnologia”, disse Yohanes Sulaiman, um professor da Universidade de Defesa Indonésia. “É tudo parte da paranoia deles.”

“Eles acreditam nessa ideia de guerra por procuração”, ele disse. “O inimigo não está lá para nos atacar diretamente; eles querem fazer uma lavagem cerebral em nós, jovens adolescentes, que estão concentrados no Pokémon e se esquecendo de seu dever de defender o país.”

Ao longo das décadas, políticos e oficiais de segurança indonésios muitas vezes defenderam a teoria de que o país se encontrava sob constante ameaça de seus vizinhos do Sudeste Asiático, bem como do Ocidente.

Em março de 2015, o general Gatot Nurmantyo, chefe do Exército indonésio na época e hoje comandante das Forças Armadas do país, declarou em um discurso que havia uma “guerra por procuração” sendo travada por elementos estrangeiros para roubar o território do país e viciar a juventude da nação em drogas.

Em 2008, o ministro da Saúde do país, Siti Fadilah Supari, sugeriu que os Estados Unidos estavam liderando uma conspiração para transformar o vírus da gripe aviária em uma arma biológica e deixar países em desenvolvimento que precisam de vacinas à sua mercê.

Robertus Robet, um professor de sociologia na Universidade Estatal de Jacarta, disse que as forças de segurança da Indonésia, mesmo há mais de 15 anos na transição do país de uma autocracia para uma democracia, continuam a “projetar seu próprio medo em alguns objetos empíricos como um jogo como Pokémon.”

No entanto, de fato ocorreu pelo menos um lapso de segurança.

Na noite de segunda-feira, um cidadão francês que trabalha na Indonésia foi detido temporariamente depois de adentrar o território de uma base militar na província de Java Ocidental enquanto procurava por personagens do Pokémon, segundo ele. Ele por fim foi liberado, de acordo com a polícia local.