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'Ou vota ou vota', diz presidente da Câmara sobre Marco Civil da Internet

Presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), durante evento realizado em julho - Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
Presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), durante evento realizado em julho Imagem: Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados

Fernanda Calgaro

Do UOL, em Brasília

12/11/2013 18h44

Para conseguir destrancar a pauta, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou no início da noite desta terça-feira (12) que “ou vota ou vota” o Marco Civil da Internet na próxima semana. Líderes dos partidos na Câmara também acreditam que o projeto ficará para a próxima semana.

O projeto de lei tramita em regime de urgência a pedido do Palácio do Planalto e, enquanto não for votado, nenhuma outra matéria poderá ser apreciada em plenário.

O governo pediu mais alguns dias para tentar costurar um acordo com parlamentares da base aliada contrários ao texto e só, então, votar o Marco Civil.

“Não adianta um texto ir tão desacordado [sem acordo] assim, porque chega lá e tem obstrução e não se vota. Então, é melhor um pouquinho mais de dias, visando o prazo limite para que essa Casa possa votar e cumprir o seu dever”, disse Alves. Ele garantiu que da semana que vem não deverá passar: “Agora ou vota ou vota”.

Ele se queixou do uso do dispositivo que permite ao Executivo pedir urgência na votação de um tema e, assim, trancar a pauta.

“É constrangedor porque a Câmara pode ficar trancada. A solução para isso é votar. Juntar parlamentares no plenário que digam sim ou não. O que nós não queremos é que isso vire uma prática. Essa Casa não pode ficar sem trabalhar por causa de urgências constitucionais.”

A votação do projeto de lei que cria princípios gerais de uso da internet já foi adiada diversas vezes. No entanto, a presidente Dilma Rousseff decidiu pedir urgência na aprovação em resposta às denúncias de espionagem por parte do governo americano.

O líder do governo na Câmara, Arlingo Chinaglia (PT-SP), disse que o adiamento das votações foi uma decisão política. Segundo ele, aguardar o consenso sobre o piso dos agentes foi um compromisso assumido por alguns líderes e por Alves, presidente da Casa.

Considerado uma espécie de "Constituição" da internet, o projeto de lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da rede no Brasil. Já a neutralidade defende tratamento igualitário de todo o tráfego de internet por parte das operadoras de internet fixa e móvel. Na prática, isso impediria que essas empresas vendessem pacotes limitados (como acesso restrito a redes sociais).

Alterações técnicas
Pela manhã, José Eduardo Cardozo (ministro da Justiça) e Ideli Salvatti (ministra das Relações Institucionais) se reuniram na Câmara dos Deputados com líderes da base aliada para discutir os impasses do Marco Civil. Cardozo disse que o governo aceitará fazer modificações na redação do projeto de lei, sem que isso prejudique questões caras ao Planalto, como a neutralidade.

"A questão da neutralidade tem tido uma grande discussão com alguns segmentos da base. O governo a defende, mantém a sua posição, mas acredito que é possível superar alguns entraves com alguma questão redacional, sem que abramos mão de alguns princípios que são próprios para garantia da isonomia."

PMDB afirma apoiar neutralidade, mas não como está no marco civil

Diante dessa possibilidade, o líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha (RJ), disse que discute apenas "fatos" e não "tese", referindo-se à promessa de o governo ajustar o texto. "Eu discuto fato. Fato é o que vier me propor por escrito. Se o que estiver escrito refletir aquilo que a minha bancada se posicionou, terá o nosso apoio. Senão, não."

Ele voltou a bater na tecla que o texto atual do Marco Civil encarecerá o serviço para o usuário. "Com relação ao que o relator propôs, ele está interferindo na atividade econômica, está interferindo com os usuários, fazendo com que os usuários, ao fim, paguem mais caro na utilização da internet. O PMDB é contrário a isso."

Cardozo afirmou estar "animado" com a perspectiva de acordo. "Eu saio animado com a possibilidade de chegarmos a um bom resultado em que a neutralidade, evidentemente, ficará assegurada, mas atendendo a situações estritamente técnicas que possam dar maior clareza ao texto."

Relator do marco civil da internet defende neutralidade 

Neutralidade
As empresas de telecomunicações (como Vivo, Claro, TIM, NET, GVT) não são a favor da neutralidade e reivindicam o direito de vender pacotes fechados. Já os provedores acreditam que a internet deve ser neutra e que planos fechados limitam a liberdade de o usuário conhecer novos sites, além de impedir que outras empresas de conteúdo digital ganhem espaço no mercado.

Na discussão sobre o Marco Civil, o governo defende a neutralidade. "Não cogito abrir qualquer brecha na garantia da neutralidade da rede. Esse, que é o coração do projeto, não pode ser violado e nós vamos lutar por ele até o fim", afirmou o deputado e relator do projeto, Alessandro Molon (PT-RJ).

Segundo ele, aprovar o Marco Civil sem a neutralidade seria "preconceito contra pobre". Isso porque, explicou, ao oferecer planos limitados (apenas para enviar e receber e-mails, por exemplo), as empresas não forneceriam uma experiência completa aos usuários.

Do outro lado está o PMDB, que prevê o encarecimento do acesso à internet no Brasil. "Se for necessário oferecer uma infraestrutura igual para todo mundo, de forma ilimitada, tenho de oferecer a maior. Não tem almoço de graça [...]. Alguém vai pagar a conta e óbvio que isso aumenta o custo para o usuário", disse o deputado federal Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB na Câmara. Molon negou que a aprovação da neutralidade encareceria o acesso.


Veja abaixo perguntas e respostas que explicam o Marco Civil

- O que é o Marco Civil?
Projeto de lei que estabelece "princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil". As determinações do projeto dizem respeito aos usuários de internet, os provedores de conexão, provadores de conteúdo e o governo.

- Quais são dos direitos e garantias estabelecidos pelo Marco Civil?
Os destaques do projeto são: o direito à privacidade, o sigilo das comunicações, o direito à não suspensão da conexão, a manutenção da qualidade contratada da conexão e informações claras e completas sobre coleta, uso, tratamento e proteção de dados pessoais.

- Quais os objetivos do Marco Civil?
Um dos principais motivos da criação do projeto de lei é a insegurança jurídica, que acaba gerando “decisões inconsistentes”. Um exemplo foi o caso da modelo Daniela Cicarelli. Após processar o site YouTube, pelo fato de usuários terem postado um vídeo íntimo da modelo, um juiz determinou que o site de vídeos fosse bloqueado no país.

- Quem participou da elaboração do projeto?
A iniciativa para a criação do projeto começou em outubro de 2009 e partiu da Secretaria de Assuntos Legislativos da Justiça (SAL/MJ) e a Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas. O projeto ao longo dos anos recebeu contribuições da sociedade civil, parlamentares e representantes de empresas. O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) é relator do projeto.

- O que o Marco Civil estabelece sobre a neutralidade da rede? 
Esse item propõe que o responsável pela transmissão do conteúdo deve tratar de forma igual quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino. Essa área envolve dois setores: as empresas de telecomunicações (como Vivo, Claro, TIM, NET, GVT, entre outros), que fornecem conexão à internet, e provedores de acesso (como UOL, Terra, IG e Globo).

As teles reivindicam o direito de vender pacotes fechados de internet, como planos para celular que limitam acesso a redes sociais ou sites pré-determinados. Já os provedores acreditam que a internet deve ser neutra e que a escolha de planos com conteúdos fechados limita a liberdade de o usuário conhecer novos sites, além de impedir que outras empresas de conteúdo digital ganhem espaço no mercado.

- O que o Marco Civil estabelece em relação à remoção de conteúdo da internet?
O conteúdo publicado na rede envolvendo questões de direitos autorais poderá ser tirado do ar após uma simples notificação - sem a necessidade de decisão judicial.

- O que o Marco Civil estabelece em relação a conteúdo ofensivo?
Os provedores só terão de remover conteúdo mediante ordem judicial. O provedor de conexão não será responsabilizado civilmente por essas ações. Mas isso pode acontecer com o provedor de aplicações, caso não sejam tomadas providências após “ordem judicial específica” para tornar indisponível o conteúdo. O texto diz que o marco visa “assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”.

Deputado mostra apoio em forma de literatura de cordel

- O que o Marco Civil estabelece quanto à privacidade?
O Marco Civil assegura ao internauta o direito de inviolabilidade da intimidade e vida privada, além da inviolabilidade e sigilo do fluxo e de suas comunicações pela internet (salvo por ordem judicial).

Os prestadores de serviços não podem fornecer dados pessoais e de registros a terceiros - a não ser que haja consentimento para isso.  As companhias também precisam informar de forma “clara e completa” sobre a coleta, uso, armazenamento, tratamento e proteção desses dados. Ao término da relação entre as partes, o usuário pode requerer a exclusão definitiva das informações fornecidas a aplicação de internet.

- O que o Marco Civil estabelece quanto ao registro de dados?
Os provedores de conexão devem manter os registros (data e hora de início e término da conexão, duração e endereço IP) sob sigilo, em ambiente controlado de segurança, por um ano. Já os provedores de aplicações de internet (caso do Facebook e Gmail, por exemplo) podem optar por não guardar esses registros – uma ordem judicial, no entanto, pode obrigá-los a fazer o armazenamento por “tempo certo”.

As operações de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de dados (registros, dados pessoais ou comunicações) devem ter pelo menos um desses atos realizado em território nacional. Dessa forma, precisa respeitar a legislação brasileira. O Poder Executivo, por meio de decreto, pode ainda obrigar provedores de conexão e aplicações de instalarem ou utilizarem em território nacional suas estruturas para armazenamento, gerenciamento e disseminação de dados.