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Aplicativo espião oferecido para pais grava SMS, fotos e até ligações

Aplicativo mSpy permite monitorar uso de smartphone de uma pessoa - Divulgação
Aplicativo mSpy permite monitorar uso de smartphone de uma pessoa Imagem: Divulgação

Guilherme Tagiaroli

Do UOL, em São Paulo

09/12/2013 06h01

“Espione o que os funcionários de sua empresa estão fazendo” e “bisbilhote o smartphone de seus filhos para saber se eles usam drogas”. Esses são alguns dos chamarizes utilizados pela empresa mSpy para vender seu aplicativo, que leva o mesmo nome da companhia e monitora todas as atividades de um smartphone - isso sem o usuário ter conhecimento. Por mais invasiva que a prática seja, o uso do programa é considerado legal. 

mSpy

O que é: Software espião instalado para monitorar um smartphone. Atividades são vistas por meio de uma “central” acessada por meio de um navegador
Preço: R$ 80/mês (licença Casa) e R$ 166,66/mês (licença Negócios)
Plataformas: Android, iOS (apenas aparelhos com jailbreak) e BlackBerry
Para que serve: Empresa diz que o objetivo é ajudar pais a monitorarem os filhos e para companhias que querem controlar o uso do smartphone corporativo
Pontos positivos: Aplicativo espião mostra informações mais importante de um smartphone, como imagens, SMS e até grava chamadas
Pontos negativos: Difícil instalação; no iPhone, só funciona em aparelhos com jailbreak

Criado no Reino Unido, o aplicativo foi testado pela reportagem do UOL Tecnologia, que ficou espantada com o tipo de informação coletada e o nível de discrição. O programa permite, por exemplo, gravar ligações feitas pelo telefone (!), ter acesso a todas as fotos do dispositivo e ler todas as mensagens de texto trocadas.

Após instalar o aplicativo no smartphone a ser monitorado (procedimento é descrito mais abaixo), o “espião” recebe um login e senha para acessar um site, onde é possível checar todas as informações. Ele pode, por exemplo, configurar um tempo específico para o celular enviar os dados para essa “central do espião”, além de escolher o tipo de conexão utilizada (Wi-Fi ou 3G).

Propósito

Apesar de poder ser usado para diversos objetivos, a mSpy recomenda apenas para fins empresariais e entre pais e filhos. “Sabemos que há pessoas que usam o aplicativo para monitorar seus parceiros, mas essa não é nossa prioridade”, informou a empresa à reportagem.

“O aplicativo viola a privacidade e a intimidade das pessoas. Ele poderia ser utilizado no ambiente de negócios, mas com a ciência dos funcionários e em smartphones fornecidos pela empresa. Para os pais, eu não recomendo. Se o filho descobrir, quebrará a confiança entre eles e a situação pode piorar”, disse Isabela Guimarães, advogada especialista em direito digital, sócia do escritório PPP Advogados.

Quem usar o aplicativo para tentar coletar provas poderá se dar mal perante a Justiça. “Informações obtidas de forma ilícita não têm valor jurídico”, afirmou Isabela.

O uso do aplicativo é legal para o que se propõe. Mas, dependendo do tipo de uso, pode resultar em prisão para o espião - caso, por exemplo, de uma empresa que interceptar o aparelho de seu concorrente. Segundo Renato Opice Blum, advogado especialista em direito digital, a lei determina pena de dois a quatro anos para quem interceptar o fluxo de dados.

Teste

Durante três dias de teste da licença Home Premium (que custa R$ 80), o aplicativo executou bem quase todas as funções às quais se propõe.

De cara, não há sinais de que o aplicativo espião está rodando no celular. Ao tentar instalar o Twitter houve um pequeno problema que impedia a conclusão da operação, resolvido após ligar e desligar o aparelho. No entanto, não deu para saber se isso ocorreu por alguma falha do Android ou por interferência do sistema.

Com o aplicativo, foi possível ver a localização do telefone, eventos cadastrados no calendário, a lista de contatos, as imagens registradas com a câmera do aparelho, o histórico de navegação, de conversas SMS e ligações feitas e recebidas.

A disponibilização das informações na “central do espião” não é imediata. O usuário pode controlar o tempo que o painel de controle será atualizado. Quanto maior for a frequência do envio de dados do smartphone, maior será o gasto de bateria – o que pode levantar suspeitas. Por padrão, ele disponibiliza novas informações a cada 20 minutos e apenas quando o celular estiver conectado a uma rede Wi-Fi.

Apesar de se vender como aplicativo espião, a reportagem achou formas de burlar alguns recursos do sistema. A navegação pode ser ocultada instalando outro browser ou usando o modo privado. Para conversar com alguém sem ser monitorado, uma sugestão é enviar mensagens diretas via Twitter. Nos testes, nenhuma dessas atividades foi registrada na “central do espião”.

Instalação

O programa está disponível para Android e iOS. No entanto, a instalação dele é difícil, pois o aplicativo não é achado facilmente em lojas convencionais de dispositivos móveis (como App Store e Google Play). Para instalar no Android, foi necessário baixar um arquivo direto do site da mSpy e ativar a opção instalar aplicativos de origem duvidosa no sistema.

No caso de quem quer monitorar redes sociais num sistema com Android, é necessário executar o root – um recurso voltado para desenvolvedores que lhe dá pleno controle do aparelho. O problema é que, ao executar essa operação, o usuário pode apagar todos os dados.

Já no iPhone, a situação é pior. Ele só consegue monitorar o dispositivo se o usuário tiver um telefone com jailbreak (prática que desbloqueia o aparelho da Apple de restrições impostas pela companhia). Ao fazer isso, a pessoa perde a garantia do gadget e não tem acesso às atualizações disponibilizadas pela marca.

Conclusão

Mesmo com um processo de instalação difícil comparado a qualquer aplicativo convencional, o mSpy cumpre bem a tarefa proposta. Assusta a dificuldade em desinstalar o programa. A desenvolvedora recomenda que o espião desative o serviço pela “central”, mas também é possível resetar (sem recuperar aplicativos) o celular ou procurar os arquivos e apagá-los um a um (essa última opção não é recomendada para usuários leigos).

Monica Iozzi, do CQC, ataca de espiã cibernética