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Facebookcídio: usuários contam por que saem do Facebook (e por que voltam)

Ana Ikeda

Do UOL, em São Paulo

23/01/2014 06h00Atualizada em 05/01/2015 14h25

Por que esqueceu meu aniversário? Por que não foi à minha festa? Por que não comentou a foto que postei? Por que sumiu? Essa é a enxurrada de perguntas enfrentadas por quem decide apagar o perfil no Facebook. Em comum, essas pessoas veem a rede social como uma grande intrometida: ela atrapalha a comunicação (em vez de ajudar), acirra conflitos de opinião e, acima de tudo, é o reino da procrastinação. O “facebookcídio” é tido como a saída para recuperarem o sossego (e a privacidade) na vida.

O Facebook em números

1,19 bilhão de usuários únicos mensais no mundo
76 milhões de usuários únicos mensais no Brasil
47 milhões de usuários únicos diários no Brasil
44 milhões de usuários únicos mensais brasileiros via dispositivos móveis
20 milhões de usuários únicos diários brasileiros via dispositivos móveis
  • Fonte: Facebook / Dados do 2º trimestre de 2013

Com 76 milhões de usuários no Brasil, a rede de Mark Zuckerberg passa por um momento que lembra o “orkuticídio” (quando usuários debandaram da rede social do Google), mas por motivos diferentes. Enquanto a reclamação naquela época era a espionagem virtual, agora a superexposição deliberada praticada nos perfis e a “guerra” nos comentários são motivos para um “facebookcídio”.

Procurada pela reportagem do UOL, a assessoria de imprensa do Facebook  disse que a empresa não divulga o número de usuários que deixam a rede.

Excluir o perfil na rede, muito mais do que uma medida radical, acaba funcionando como um “empurrão” para essas pessoas retomarem contatos na vida real e repensarem no propósito de usar uma rede social. Essa última reflexão, paradoxalmente, leva alguns a voltarem à rede. Mas, no retorno, o uso passa a ser bem mais comedido.

Veja abaixo quatro casos de pessoas que saíram do Facebook:

Cansaço e enjôo

  • Arte/UOL


Lúcia*, 23, professora de inglês, talvez seja o exemplo clássico de quem sai do Facebook (no caso dela, para depois voltar). Ela "enjoou" da rede social. “Reparei que estava gastando muito tempo com notícias e informações em que eu não estava particularmente interessada, que acabava lendo só porque apareciam no feed de notícias.”

Um outro problema, aponta Lúcia, é a desconcentração causada pelas novidades e mensagens que vão aparecendo sem você pedir. “Sem eu perceber, meia hora já tinha ido embora nas visitas de perfil em perfil, meio sem rumo, algo que para mim era mais uma perda de tempo do que uma diversão.”

Ela conta que já ‘foi e voltou’ várias vezes e que fica afastada em média até três meses da rede social. Algo facilitado pelo recurso de “desativar” o perfil, que mantém os dados e posts da pessoa caso ela queira voltar.

“Na primeira vez que eu ‘deletei’, eu ainda ficava ativando e desativando [o perfil] todo dia, mas com o tempo eu fui me esquecendo dele.”

No tempo em que passou fora do Facebook, ela afirma ter ficado mais tranquila. “Gastava meu tempo online em coisas que me interessavam de verdade, coisas que eu mesma ia atrás, lendo meus sites preferidos e fazendo outras coisas mais produtivas”, detalha.

Entre os pontos negativos para ela está o contato perdido dos amigos que moram longe, o que acabou fazendo com que ela retornasse ao Facebook. “Mas eu acho que desde que eu voltei, da última vez, tenho estado mais quietinha, usado a rede mais para mandar mensagens etc”, diz.

Para evitar a superexposição, ela evita publicar posts. “Eu também não gosto muito do fato de que todo mundo pode ver os comentários que você deixa para alguém ou o post que você escreve no mural de alguém. Eu prefiro poder manter a minha privacidade.”

Linha cruzada

  • Arte/UOL


Julianna Azevedo, 29, advogada, resolveu sair definitivamente do Facebook (ela já havia deletado o perfil em outra ocasião) depois de perceber que a rede social estava mais atrapalhando do que ajudando a manter contato com os amigos.

“Moro em São Paulo e tenho amigos em Dourados [MS], então voltei para o Facebook para manter contato mais próximo com eles. Mas eles mandavam mensagens e eu não respondia, porque eu quase não entrava no meu perfil”, lembra. O resultado disso foram cobranças frequentes de “Por que você não respondeu minha mensagem?”.

O desinteresse por checar diariamente o perfil na rede social ocorreu, segundo ela, pelos posts que encontrava quando acessava o feed de notícias. “O pessoal reclamava demais e também se expunha demais. Se a rede é para essa finalidade, para mim não serve.”

No final, Julianna encontrou no WhatsApp, aplicativo de mensagens instantâneas, a solução para manter contato com os amigos de outro Estado – e também com outros grupos mais próximos. “Lá você cria grupos e se comunica com quem você quer, não com todo mundo de uma vez só”, comenta.

Além do espanto dos amigos quando fala que não usa o Facebook, Julianna confessa que acaba perdendo encontros porque o convite é feito pela ferramenta de eventos do Facebook. Outra desvantagem é que o WhatsApp faz seu celular “apitar” a todo momento com o grande número de mensagens trocadas. “Mas não me sinto tentada a voltar para o Facebook. No WhatsApp o contato é sem ‘lenga lenga’.”

Distração e procrastinação

  • Arte/UOL

Pedro Pup, 21, internacionalista, tomou a atitude “radical” de sair do Facebook para dar um fim à distração causada pela rede social. “Por mais que eu tentasse me concentrar para escrever, corrigir, adaptar, ou fazer alterações, o Facebook tirava minha atenção”, lembra.

Com a monografia de conclusão de curso recusada duas vezes, até mesmo seu orientador reforçou a tese de que o Facebook estava atrapalhando Pup. “O professor me alertou diversas vezes que me via on-line no Facebook todas as vezes que ele entrava.”

Pup, que nunca tinha pensado em desativar o perfil, acabou se afastando para poder dar continuidade ao trabalho acadêmico.

  • Facebook/Arquivo pessoal

    Pedro Pup, 21, saiu do Facebook para dar fim à distração

 “Foi muito difícil. Eu tinha o vício de atualizar de segundo a segundo o Facebook para ler as notícias de futebol, manchetes dos jornais, piadinhas”, conta.

“Depois eu sentia como se tivesse um vazio dentro de mim. Não tinha mais o que atualizar, só a monografia”, brinca.

Fora da rede, ele afirma ter retomado contato direto com seu círculo de amizade. As desvantagens, diz Pup, foram mínimas.

“Você perde a data de aniversário de um amigo querido ou um convite para um evento. No meu caso, eu perdia bastante ao deixar de acompanhar o artigo diário de um pensador realista norte-americano que eu lia para a monografia.”

A monografia entregue (e aprovada) fez Pup voltar ao Facebook. “Mas agora não tenho mais o costume de abrir o perfil no PC, só vejo as atualizações mesmo pelo celular. Acho que estou ‘curado’”, ironiza.

Conflitos de opinião

  • Arte/UOL

Maria*, 32, analista de folha de pagamentos, coleciona idas e vindas no Facebook. Ela já saiu três vezes da rede social, sempre pelo mesmo motivo: desentendimentos causados por opiniões postadas no site. Eles atrapalharam seu relacionamento com amigos – e com a própria mãe.

“Saí por conflitos com minha mãe, que também é usuária da rede e, por discussões com alguns amigos. Às vezes, minha mãe não gosta de algo que posto. E se é bloqueada, ela acaba descobrindo por amigos que temos em comum sobre o post. É difícil limitar o acesso dela”, explica.

Maria disse ter proposto à mãe não tê-la mais entre os amigos da rede social para evitar discussões. “Claro, ela ficou ofendida. Ela mesma já saiu e voltou ao Facebook algumas vezes, chateada pelas coisas que lia.”

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  • http://tecnologia.uol.com.br/enquetes/2014/01/22/qual-motivo-levaria-voce-a-sair-do-facebook.js

Com relação aos amigos, também aconteceram discussões que incomodaram Maria.  “Há muitos desentendimentos, interpretações mal feitas, coisas que, em uma discussão ao vivo, não ocorrem com tanta frequência. Resumindo: tenho o pavio curto e ligo muito para o que os outros pensam.”

No começo foi difícil ficar sem o Facebook, mas com o passar do tempo ela se acostumou. “Senti-me até mais aliviada”, afirma. A vantagem de não estar na rede, no caso dela, é não ler coisas que me chateiam, nem chatear os outros. Outra vantagem, diz ela, é ter tempo para "fazer coisas mais produtivas”.

Mas a dificuldade de manter contato com os amigos no Brasil – Maria mora em outro país – fez com que ela voltasse a ativar o perfil na rede. Agora, no entanto, ela quase não publica posts nem emite opiniões. “Isso me chateia um pouco, sim, acabo não expressando tudo o que penso ou sinto. Mas eu também tenho consciência que é uma limitação colocada por mim.”

Tantas idas e vindas fizeram Maria refletir sobre o uso da rede. “Acho que as pessoas estão lá porque, no fundo, gostam de se expor e têm curiosidade de saber da vida dos outros. Algumas delas não sabem lidar com as consequências negativas disto. No caso, eu sou uma dessas pessoas.”

*A entrevistada pediu para não ter a identidade revelada