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Para não virarem dependentes, usuários se desconectam do WhatsApp

Carolina Elena Viña, 44 - Arquivo Pessoal
Carolina Elena Viña, 44 Imagem: Arquivo Pessoal

Larissa Leiros Baroni

Do UOL, em São Paulo

22/04/2015 06h00

O WhatsApp conseguiu chegar a 800 milhões de usuários. Nesse ritmo, com o qual ganha aproximadamente 100 milhões novos cadastrados a cada quatro meses, o aplicativo pode chegar à marca de 1 bilhão de usuários em menos tempo que o Facebook levou.

Por isso ele parece tão presente nos smartphones de uma parcela significativa dos usuários brasileiros. Mas ainda há muita gente sem acesso à rede. Segundo um estudo publicado pela Unesco e pela UIT (União Internacional das Telecomunicações), 48,4% da população brasileira não está conectada.

Outros preferem outros aplicativos, como o Viber ou o Messenger do Facebook. Mas muitas pessoas têm optado por não conversarem por esse app por darem mais valor a sua "privacidade".

É o caso de Carolina Elena Viña, 44, doutora em ciências biológicas e professora da Unisa (Universidade de Santo Amaro). Ela, que mora em São Paulo, até reconhece as vantagens do uso do app, mas prefere se desligar.

"Meu celular é o mais simples do mercado, só o uso como despertador, bem como para fazer e receber chamadas", conta ela, que diz ter comprado o seu primeiro aparelho móvel aos 37 anos, quando ficou grávida de sua primeira e única filha. "É somente por ela que continuo usando", completa. A professora diz odiar ser "dependente de qualquer tecnologia" e, justamente por não gostar, acaba sendo bastante desligada. "Estou sempre esquecendo o telefone pelos cantos."

Nem mesmo o namorado, que mora na Argentina, a convence a aderir ao WhatsApp. Seria muito mais fácil e rápido manter contato com ele. A opção é enviar e-mail duas vezes por dia. Para se comunicar com os amigos e com os parentes, ela recorre ao bom e velho telefonema. Vez ou outra, Carolina até apela para o SMS (Serviço de Mensagens Curtas, na sigla em inglês). "Prefiro mesmo é escrever, porque sei que vai ser algo mais rápido do que uma ligação", relata ela.

Uma atitude que é criticada por alguns amigos e, muitas vezes, vista como antiquada. "Reconheço as vantagens do WhatsApp, que te permite mais fácil acesso às pessoas, a questão é que muitos acabam não tendo limite. Parece que, quando você está conectada, é obrigada a ficar disponível o tempo todo. Prefiro muito mais a minha privacidade e um pequeno sossego em uma vida que já é bastante agitada", justifica ela, que diz que a tecnologia tende a "bobotizar" os usuários.

"Parece um caminho sem volta. Quando se inserem nesse ambiente, se focam quase com exclusividade a ele. Muitos acabam até não se atentando o que está acontecendo a sua volta", afirma ela. "Outro dia quase atropelei uma pessoa que estava atravessando a rua e olhando para o celular. As pessoas perdem a noção mesmo", acrescenta a professora, que também não está inserida nas redes sociais e diz não sentir a mínima falta. "As relações na rede são muito superficiais. Quando a pessoa realmente é seu amigo, você conseguirá manter o contato mesmo estando longe e fora desse universo virtual."

O estudante de Montes Claros (MG) Iury Veloso, 20, não é tão desconectado quanto Carolina. Ainda que tenha optado por desinstalar o app do WhatsApp em seu smartphone, ainda mantém seu perfil no Facebook. "Decidi usar o aplicativo porque todos os meus amigos estavam usando", conta ele, que diz ter perdido o interesse com o excesso de mensagens desnecessárias que recebia. "Não era nada útil e só ocupava espaço no celular."

Como alternativa de comunicação instantânea, Veloso recorrer ao Messenger do Facebook. "Não é tão funcional, mas tem atendido as minhas necessidades e não me irrita tanto quanto o WhatsApp me irritava", afirma ele. Apesar dos insistentes pedidos da irmã e dos amigos para que volte ao app, o estudante diz não ter a mínima intenção de fazer isso.

Vencidos pela pressão social

Há algumas pessoas, no entanto, que não conseguiram resistir à pressão social e acabaram se rendendo ao WhatsApp. Um delas é o administrador de empresas Rodrigo Paes Lima, 37, que se viu obrigado a trocar o seu simples celular por um smartphone --ainda que não de última geração. "Me orgulhava do meu celular, que apenas ligava, recebia e passava mensagens. Era perfeito pra mim. Mas ele simplesmente estragou e precisei comprar um substituto. Mas quem disse que encontrei um igual? Por falta de opção, tive que recorrer a um smartphone", relata o morador de Goiânia (GO). 

Rodrigo Paes Lima, 37 - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Rodrigo Paes Lima, 37
Imagem: Arquivo Pessoal

Ele, que tentou resistir o quanto pôde aos telefones modernos, acabou tendo a sua disposição os mais diferentes aplicativos, entre eles o WhatsApp. "Tive que dar o braço a torcer. É útil em determinadas funções. Mas o uso de modo consciente. Não sou daqueles que tira fotos de tudo e de todos. É um aplicativo que veio para ficar", conta Lima, que cita como desvantagem do app a "falta de bom senso" dos próprios usuários.

"Muitos ficam boa parte do dia olhando e digitando no celular. Não quero e me policio sempre para não ser escravo dessa tecnologia que escravizou boa parte do mundo", diz. Ele afirma não querer fazer parte da geração "cabeça baixa". "Hoje a maioria das pessoas vivem de cabeça baixa para olhar para o smartphone. As pessoas dão mais atenção para o virtual do que para o pessoal."

Não à toa, o administrador mantém o celular no silencioso enquanto trabalha e costuma consultar as mensagens do WhatsApp umas quatro vezes por dia. "Meus amigos já sabem, se têm alguma coisa urgente para falar comigo, precisam me ligar." 

André Luiz Alvez, 50 - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
André Luiz Alvez, 50
Imagem: Arquivo Pessoal

Mesmo tendo dificuldades em mexer no dispositivo, o publicitário, escritor e ator de teatro André Luiz Alvez, 50, conta com a ajuda da filha para se manter conectado no WhastApp. "Se dependesse de mim, a gente continuaria só no bom e velho e-mail. Mas, para conseguir marcar ensaio com os atores, precisei me render ao app", conta ele, que diz ter medo de se ver "envolto" com a tecnologia, assim como todas as pessoas que tanto critica.

"Me irrita muito ver as pessoas alienadas à realidade em função da vida cibernética. Motivo que me faz entrar em conflito com minha própria filha e até mesmo com alguns amigos, que mesmo em um momento de descontração não conseguem desgrudar do telefone", afirma ele, que mora em Campo Grande (MS). "Talvez seja justamente pelo medo de me ver rendido a isso não faço questão de aprender."

Assim como Lima, Alvez pouco consulta as suas mensagens no WhatsApp. "Vejo [as mensagens] umas três vezes por dia --de manhã, à tarde e à noite. Muitas vezes acabo desligando o celular para não ficar tentado a olhar as notificações", relata o autor, que diz que, quando estava desconectado, se sentia "um ser primitivo, o homem das cavernas que falava".