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Entre raiva e conformismo, motoristas do Uber na França lamentam proibição

Pichação "morte ao Uber" na região oeste de Paris, em junho, antes da proibição - Kenzo Tribouillard/AFP
Pichação "morte ao Uber" na região oeste de Paris, em junho, antes da proibição Imagem: Kenzo Tribouillard/AFP

Adrien Candau e Jean Baptiste Jacquin

09/07/2015 06h00

Dez mil pessoas estavam cadastradas no aplicativo, suspenso no dia 3 de julho

“Como vou pagar meu aluguel de julho? Sinceramente, não sei! Estou na m...”, diz Brahima Diallo, que na primavera havia encontrado moradia em um conjunto habitacional em Cergy-Pontoise, na região parisiense, “graças ao UberPop”. Aos 26 anos de idade, após anos sem emprego e um pequeno esquema para ter um Renault Clio com a habilitação em seu nome, ele começou a percorrer as ruas da capital esperando que o aplicativo móvel desenvolvido pela empresa americana Uber fosse lhe conseguir passageiros.

Quando ele soube pela internet, na sexta-feira (3), da determinação de suspensão imediata do UberPop, ele foi até a sede da empresa, no 19º arrondissement de Paris, para devolver o smartphone que lhe servia de GPS e as reservas. “Recuperei os 200 euros de depósito, já é alguma coisa. Mas estou ferrado de novo.”

Segundo o Uber, havia cerca de 10 mil pessoas cadastradas nessa plataforma que conecta passageiros a motoristas, permitindo que qualquer um possa bancar o taxista. Em total ilegalidade, segundo o governo. Agora eles estão órfãos dessa atividade que lhes garantia uma renda complementar e, no caso de alguns, havia se tornado a única salvação.

“Todos têm direito de comer”, lamenta Ahmed Ibourichène. Esse aposentado de 68 anos trabalhava desde setembro de 2014 pelo UberPop, rodando de quatro a cinco horas por dia, e às vezes nos finais de semana. Ele terá de dar adeus aos 800-1.500 euros de renda complementar que ele obtinha, contentando-se com sua pensão mensal de 1.300 euros. “Não digo que os táxis estejam errados, mas eles poderiam ter limitado o UberPop a algumas horas por dia, ou a um determinado montante de dinheiro por mês”, ele analisa.

Eles esperam que o aplicativo seja reativado em setembro. Todos estão contando com essa decisão do Conselho Constitucional que o Uber diz estar aguardando antes de decidir definitivamente o destino desse serviço. “Essa atividade era boa para a economia, pois era dinheiro circulando. É bom para o crescimento”, ressalta Ahmed Ibourichène.

Dinheiro não declarado

Na segunda-feira (6), um pequeno grupo protestava em frente à porta “fechada excepcionalmente” da sede do Uber, em Paris. O sentimento geral oscilava entre raiva e incompreensão. Fred, 33, estava revoltado com o ministro do Interior, Bernard Cazeneuve, que havia ameaçado os motoristas de sanções penais e apreensão de seus veículos. “É uma palhaçada. Estão acusando os condutores do Uber de não pagarem impostos e de criarem uma situação de concorrência desleal, mas foi o Estado que não criou nenhuma estrutura para que os condutores fossem tributáveis!”, critica um jovem pai de família.

Para ele, essa nova atividade havia se tornado “pouco mais que uma fonte de renda complementar”. Atualmente desempregado, no passado ele havia tentado obter uma licença de taxista, mas depois desistiu. “Pode levar até quinze anos para conseguir isso! É impensável quando se tem uma família para sustentar.” Fred diz que está considerando se tornar VTC, que são os motoristas profissionais de carro de transporte com chofer. O Uber prometeu publicamente que ajudaria seus condutores UberPop a fazerem isso, mas na verdade a empresa só está lhes informando sobre os procedimentos a serem seguidos e dando-lhes as coordenadas de centros de formação.

Desempregado, Michael atuava como chofer pelo UberPop desde abril, e pretendia assim “economizar para pagar um curso de VTC”. Esses cursos de 250 horas geralmente custam mais de 3 mil euros e podem ser financiados integral ou parcialmente pelo Pôle Emploi (agência pública de empregos)... sob determinadas condições.

Alguns já haviam se antecipado. Issam afirma que “era totalmente previsível que o UberPop fosse acabar. Melhor, assim há mais corridas para mim!”. Em junho de 2014, esse ex-usuário do UberPop se lançou pelas ruas de Paris com um Mégane para financiar seu curso de VTC. O dinheiro ganho não declarado também lhe permitiu comprar um carro maior usado. “Agora estou trabalhando para o UberX – o serviço VTC do Uber – e também tenho meus próprios clientes.”

Liâam, que preferiu não se identificar, havia tomado gosto por essa fonte complementar de renda que lhe rendia cerca de 300 euros por semana. Gerente de uma mercearia em Argenteuil (Val-d’Oise), ele não consegue pensar em outra atividade que possa lhe render o mesmo valor. “Não há muitas atividades que permitam ter dinheiro disponível imediatamente. O mais comum é você receber no final do mês.”

Já Borat, 46, vê nesse caso uma forma de imobilismo econômico à francesa. “Enfim, aqui não deixam as pessoas progredirem”, ele diz irritado.

Tradutor: UOL