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Para Mark Zuckerberg, a filantropia é uma forma de negócio

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Imagem: Reprodução/Facebook

Natasha Singer e Mike Isaac

04/12/2015 06h00

Doação do criador do Facebook usa status de sociedade limitada para maior controle

A Chan Zuckerberg Initiative, a organização que o presidente-executivo do Facebook, Mark Zuckerberg e sua mulher, a médica Priscilla Chan, lançaram nesta semana, apresenta três letras importantes em seu nome: LLC.

LLC significa uma "limited liability company" (empresa de responsabilidade limitada ou sociedade limitada), que é um tipo específico de empresa. Seu uso em uma entidade como essa, como foi revelado na terça-feira quando o casal disse que pretendia doar 99% de suas ações no Facebook durante suas vidas, coloca em destaque um meio atípico, mas cada vez mais popular na filantropia.

Tradicionalmente, os filantropos criam organizações sem fins lucrativos para fazer doações de caridade. Segundo o código tributário federal, as caridades e fundações são obrigadas a gastar um mínimo de 5% do valor de seus fundos todo ano para fins de caridade. Também há uma designação fiscal de sem fins lucrativos para grupos de defesa, como o Sierra Clube ou a União Americana pelas Liberdades Civis.

Mas uma empresa de responsabilidade limitada atua em parte como uma empresa comum e em parte como uma parceria de negócios. A estrutura pode fornecer benefícios e, especificamente, uma vantagem importante para jovens bilionários: mais controle. (Alguns deles estão doando dinheiro mais cedo em suas carreiras, em comparação a benfeitores do passado –como os Rockefellers e Andrew Carnegie, que em grande parte iniciaram sua filantropia mais perto do fim de suas vidas.)

A estrutura LLC dá a Zuckerberg e Chan mais flexibilidade para investirem em empresas sociais com fins lucrativos e também apoiar causas políticas, lhes permitindo maior liberdade. Isso porque uma LLC possui menos regras do que uma fundação tradicional, como a exigência de 5%.

Além disso, há alguns benefícios legais e tributários. Se a LLC é processada, os ativos pessoais do casal estão isentos de consideração. Zuckerberg e Chan também não enfrentarão fardos tributários adicionais com a LCC, mas sim serão tributados como indivíduos em relação a qualquer ganho obtido pela LCC.

"Isso compra mais opções, de modo que mais à frente, eles poderiam decidir direcionar o dinheiro para entidades sem fins lucrativos ou poderiam escolher investir em empresas de energia solar realmente bacanas, que estejam causando muito bem", disse Jacob Harold, o presidente-executivo da GuideStar, um banco de dados nacional sobre organizações sem fins lucrativos. "Isso permitirá um uso criativo e flexível do capital com o passar do tempo."

Zuckerberg, 31, e Chan, 30, registraram a Chan Zuckerberg Initiative LLC em Delaware na semana passada. O casal, que anunciou a iniciativa na forma de uma carta para sua filha recém-nascida, Maxima Chan Zuckerberg, estima que sua participação acionária no Facebook esteja valendo mais de US$ 45 bilhões.

Em uma declaração, uma porta-voz do Facebook disse: "Como Mark e Priscilla deixaram claro, eles acreditam que a missão é melhor conduzida por uma combinação de atividades, incluindo o financiamento de organizações sem fins lucrativos, a realização de investimentos privados e a participação no debate de políticas".

Apesar de muitos bilionários de tecnologia, como os cofundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin, terem adotado uma estrutura típica de organização sem fins lucrativos –conhecida como 501(c)(3)– para suas fundações, LLCs estão cada vez mais ganhando espaço entre outros doadores do Vale do Silício.

Pierre Omidyar, um cofundador do eBay, criou a Omidyar Network, que adotou uma abordagem híbrida ao operar com uma estrutura tanto de LLC quanto sem fins lucrativos. Laurene Powell Jobs, a viúva de Steve Jobs, o ex-presidente-executivo da Apple, formou a Emerson Collective, uma LLC dedicada a apoiar questões de "educação, imigração e inovação".

Zuckerberg e Chan podem agora popularizar ainda mais o formato LLC.

"Se eu fosse Zuckerberg ou um de seus amigos, e estivesse doando múltiplos bilhões de dólares, eu não teria como saber o que será importante daqui centenas de anos", disse Scott A. Bishop, diretor de planejamento financeiro da STA Wealth Management. "A longo prazo, uma LLC é o melhor para esse tipo de flexibilidade."

Ao adotar uma abordagem LLC, Zuckerberg está rompendo com um de seus heróis da infância, o cofundador da Microsoft, Bill Gates, que criou a Fundação Bill & Melinda Gates e que agora trabalha em questões como a mudança climática e a erradicação da malária. O grupo de Gates criou em 2006 um fundo híbrido e uma estrutura de fundação, mas não foi criado como uma LLC.

Emmett D. Carson, o presidente-executivo da Fundação Comunitária do Vale do Silício, uma organização de caridade com US$ 7 bilhões em ativos sob gestão, disse que os filantropos de tecnologia estão empregando uma variedade de novas ferramentas, incluindo as LLCs, fundos orientados por doadores e empresas com fins lucrativos com subsidiárias de caridade. Isso porque estão acostumados a desenvolver ou abraçar novas ferramentas que causam disrupção no status quo, ele disse.

"Nós estamos à beira de uma nova renascença em filantropia, onde doadores mais jovens do setor de tecnologia estão se comprometendo em uma idade muito mais jovem e estão preparados para fazer doações muito maiores", disse Carson. "Eles estão usando várias ferramentas híbridas para realizar filantropia aqui em casa e ao redor do mundo."

Mas também há pontos negativos nas LLCs. Diferente de uma organização sem fins lucrativos tradicional, uma LLC não permite uma maior dedução de impostos quando você coloca inicialmente o dinheiro, a isenção fiscal só ocorre quando o dinheiro é doado para caridades e fundações.

No anúncio da doação pelo casal, Zuckerberg e Chan disseram que planejam tratar de alguns dos maiores problemas que a geração de sua filha pode enfrentar, incluindo doenças cardíacas e câncer, e sugeriram que financiariam pesquisas e tecnologias para tratar das causas dessas doenças. Eles prometeram doar US$ 1 bilhão por ano nos próximos três anos.

"A medicina se tornou uma ciência real apenas há menos de 100 anos e já vimos curas completas para algumas doenças e bom progresso para outras", escreveu o casal na carta no Facebook. "À medida que a tecnologia acelerar, temos uma chance real de prevenir, curar ou administrar todas ou a maioria das demais nos próximos 100 anos."

Conor Doughertt contribuiu com reportagem e Doris Burke contribuiu com pesquisa