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Além de pagar multa, Google deverá mudar Android; entenda

Android deve passar por mudanças após Google receber multa bilionária da União Europeia - Reprodução
Android deve passar por mudanças após Google receber multa bilionária da União Europeia Imagem: Reprodução

Helton Simões Gomes

Do UOL, em São Paulo

19/07/2018 11h19

A decisão da União Europeia de condenar o Google por práticas anticompetitivas pela forma como oferece o Android a fabricantes de smartphones não doerá apenas no bolso da empresa. Além de receber uma multa recorde, de € 4,34 bilhões, a gigante da tecnologia será obrigada a acabar com algumas exigências feitas ao licenciar o sistema operacional para as fabricantes, o que pode alterar o "cérebro" para celulares mais usado no mundo. 

O prazo é curto: os europeus deram 90 dias para que a empresa cumpra sua decisão. Ela, obviamente, vale apenas para os membros que fazem parte da UE. Porém, é comum que mudanças feitas por companhias de tecnologia para se adequar a determinações europeias, como a Lei de Proteção de Dados (GDPR), sejam levadas para outros lugares do todo mundo. 

Então, veja abaixo como o Android era usado para minar rivais e como o fim dessas estratégias deve impactar o sistema operacional.

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Menos apps do Google

Você já deve ter percebido que alguns celulares Android vêm de fábrica com diversos aplicativos que executam a mesma função: dois navegadores, duas galerias de foto, duas lojas de aplicativo etc. Isso pode não ser totalmente culpa de fabricantes de smartphones, que, em busca de criar um ecossistema, lotam o aparelho de diversas ferramentas.

A UE considerou uma infração às leis europeias de competição o fato de o Google exigir que fabricantes pré-instalassem nos aparelhos seus apps de busca e do navegador Chrome. Essa é uma contrapartida feita para as marcas que querem licenciar a loja de aplicativos, Google Play, e incluí-la nos dispositivos.

O Googe Play, o Chrome e outros apps do Google não fazem parte do Android. Eles são propriedades do Google e são incluídos gratuitamente no sistema operacional desde que os fabricantes cumpram as exigências da gigante, o que pode ser ruim para fabricantes e outros empresas interessadas em desenvolver serviços similares aos do Google.   

“Como parte das investigações, os fabricantes de aparelhos confirmaram que a Play Store é um app obrigatório, de modo que os usuários esperavam encontrá-lo pré instalado em seus dispositivos”, afirmou a UE.

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Entenda

O Google até tentou argumentar. Disse que associar o licenciamento da Google Play à instalação dos apps de busca e do Chrome ajudava a rentabilizar seu investimento no Android. Mas a UE descartou a explicação. Considerou que, mesmo sem as restrições, o Google já fatura bilhões de dólares com a loja de aplicativos e coleta dados dos aparelhos Android que são usados posteriormente em propagandas. 

Com isso, os próximos Android podem vir sem tantos aplicativos do Google.

Androids modificados

Outra restrição imposta pelo Google a fabricantes que desejassem ter acesso à Play Store e outros apps era a de não vender um único celular equipado com uma versão modificada do Android. Aqui, vale a explicação: não estamos falando das pequenas alterações na interface que alguns fabricantes, como a Samsung, fazem. E sim, a criação de um sistema novo a partir do código do Android, como a Amazon fez com o Fire OS.    

Para a UE, essa conduta reduziu os planos de empresas que pretendiam criar e vender aparelhos que usassem versões alteradas do sistema.

Segundo os europeus, a Amazon foi uma das prejudicadas, porque diversos fabricantes evitaram apostar no Fire OS e fabricar aparelhos que usassem esse sistema para não contrariar o Google.

Com a decisão da Comissão, mais versões do sistema do Google, que não lembram o original, devem surgir.

Pagamento para ter exclusividade

Outra prática apontada como anticompetitiva pela União Europeia eram os pagamentos feitos pelo Google para que seu serviço de busca fosse o único a ser embarcado nos celulares. Com isso, os fabricantes de aparelhos aceitavam não instalar previamente outras ferramentas concorrentes. Isso deixou de ser feito em 2014.

Celular pode ficar mais caro?

Ao fim de 90 dias, o Google deverá cessar todas as práticas acima. Se não cumprir as exigências, a empresa pode receber uma nova multa de até 5% dos negócios gerados pela Alphabet, sua empresa-mãe, além de poder virar alvo de ações civis abertas em qualquer um dos 28 países do bloco.

O Google já informou que vai recorrer da decisão. E, pior: o executivo-chefe da empresa, Sundar Pichai, sugeriu que a decisão da UE pode mudar a forma como o Android é oferecido aos fabricantes, o que pode aumentar o preço de celulares.

Se nossos aplicativos fossem excluídos da ampla gama de dispositivos que os fabricantes de celulares constroem e as operadoras de rede móvel vendem, isso afetaria o equilíbrio do ecossistema Android. Até agora, o modelo de negócios do Android possibilitou que não tivéssemos de cobrar os fabricantes de telefones por nossa tecnologia ou depender de um modelo de distribuição rigidamente controlado

Sundar Pichai, executivo-chefe do Google

Isso porque o custo para licenciar um sistema operacional, assim como o valor de qualquer outro componente, pode interferir na hora de determinar o preço final do aparelho. A conta é simples: atualmente, as marcas de celulares não pagam pelo Android e uma eventual cobrança do Google poderia ser repassada ao consumidor. 

Apesar de o Android ter seu código aberto, o que permitiria que terceiros baixassem e modificassem o sistema para criar versões alternativas, isso só dá direito às ferramentas básicas de um sistema operacional móvel e inteligente, mas não aos apps e serviços proprietários do Android, que pertence ao Google.

Os fabricantes que quiserem obter os apps proprietários do Android têm de fechar um contrato com o Google.

Ainda não está claro de que forma isso poderia acontecer, mas o Google poderia passar a vender licenças para usar o Android, nos moldes do ocorre com outros sistemas operacionais como o Windows. Ou ainda manter o sistema em código aberto e cobrar para licenciar as outras experiências, como Google Play.

“Um ecossistema saudável e próspero do Android é do interesse de todos. Estamos dispostos a fazer mudanças, mas estamos preocupados com o fato de que a decisão de hoje afete o equilíbrio que atingimos com o Android, e que isso mande um sinal preocupante em prol de sistemas proprietários no lugar de plataformas abertas”, disse.