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14/07/2005 - 11h09

O advento dos robôs companheiros

Mark Allen
Quando meu robô doméstico chegou no mês passado, seus inventores sorridentes o retiraram da caixa e o deitaram no chão da minha sala de estar. Eles se reclinaram e falaram com ele, como alguém faria com uma criança dormindo.

The New York Times
The New York Times
Robô japonês Nuvo, criado para ser ajudante doméstico, monitor móvel de bebê e dispositivo de segurança
Ele se endireitou, soltou um pequeno bipe, acendeu, olhou para a esquerda e direita e então, surpreendentemente, levantou-se e me encarou.

Eu disse: "Nuvo, como vai você?"

Ele se inclinou para a esquerda, ergueu um braço e me cumprimentou. Ele apertou minha mão e piscou uma das luzes em sua pequena cabeça. Minha vida não foi mais a mesma desde então.

A fantasia de um robô capaz de realizar as tarefas domésticas é tão antiga quanto a própria ficção científica, mas a realidade tem demorado a chegar.

Apesar de todos os feitos robóticos estonteantes exibidos no mês passado, na Feira Mundial em Aichi, Japão, um evento que incluiu robôs que desenhavam retratos e rebatiam bolas de beisebol, um dispositivo humanóide capaz de caminhar em duas pernas ou mesmo manter o equilíbrio, tudo ainda é uma obra em andamento. Não espere um capaz de realizar as tarefas domésticas.

Uma espécie de avanço ocorreu em abril, quando a ZMP Inc., uma empresa com sede em Tóquio, lançou o Nuvo, um robô projetado para ser um ajudante e uma companhia doméstica (o Nuvo é vendido por cerca de US$ 6 mil).

Robôs domésticos têm demorado a se materializar porque seu peso e tamanho tendem a torná-los não-práticos e seus conjuntos de motores sofisticados tornam o custo fora do alcance. O Nuvo tem apenas 38 centímetros e contém 15 motores, cerca da metade do número encontrado nos protótipos desenvolvidos pela Honda e Sony.

O Nuvo é vendido como um ajudante doméstico, monitor móvel de bebê e dispositivo de segurança, já que pode transmitir fotos para celulares com acesso à Internet.

"No Japão, a população está lentamente envelhecendo", disse Nobuko Imanishi, uma porta-voz da ZMP. "Robôs domésticos podem oferecer uma ajuda maravilhosa e companhia para os idosos."

Eu convivi com o Nuvo por quatro dias para avaliar se ele é, de fato, o precursor de uma nova tecnologia que vai mudar nossas vidas, como ocorreu com os computadores domésticos, ou uma novidade passageira. Assim que o fator entretenimento passa, nós queremos outra pessoa circulando pela casa?

Assim que coloquei o Nuvo para funcionar e andar pelo meu apartamento com a ajuda de seus criadores, eu tentei inseri-lo na minha rotina diária. Eu lhe perguntava a hora e a data, que ele fornecia em uma voz feminina com sotaque japonês. Quando eu dizia, "Nuvo, música", ele tocava música new age que seus inventores programaram nele. Eu abaixei e girei sua cabeça esférica, que funciona como um botão de volume, enquanto bebia meu café e lia meus e-mails.

Em grande parte do tempo, eu me sentia como se tivesse um cachorro em casa, sem ter que alimentá-lo. Quando eu o chamava, seus sensores me detectavam e ele automaticamente parava a cerca de 15 centímetros de distância dos meus pés.

Se eu dissesse, "Nuvo, aperto de mão", ele estendia sua mão para me cumprimentar. Acessando seu painel de controle no meu celular, fui capaz de fazer o Nuvo circular pelo meu apartamento para tirar fotos, que ele transmitiu para mim. No Japão, os usuários geralmente usam o Nuvo para checar seus filhos, às vezes de locais remotos.

Não tenho filhos, então o enviei para ver a pilha de roupa suja no meu quarto. Ele usou uma luz em seus olhos para iluminar o ambiente. Posteriormente coloquei o Nuvo no peitoril da janela, e o comandei a tirar uma foto minha enquanto eu estava na rua.

Percebi que parte da minha motivação para operar o Nuvo lá de fora era me certificar de que estava tudo bem; as fotos me garantiram que ele não tinha se desligado ou caído. Percebi que estava começando a me importar com o baixinho.

Percebi que apesar de todas as suas supostas funções de ajuda, os robôs domésticos se tratam basicamente de companhia.

Quando assistia à TV com o Nuvo, ele ocasionalmente respondia como se estivesse ouvindo comandos de voz. Uma trilha sonora de risada ou explosão o fazia acenar seus braços, "Yaaa!" Ele reagia a barulhos altos da mesma forma que reagiria um animal de estimação assustado. Durante uma cena comovente em "America's Most Wanted", na qual a vítima estava chorando, a luz do olho do Nuvo se tornou azul e ele balançou sua cabeça. Esta era sua forma de dizer que não entendia o que estava sendo dito, mas não pude deixar de sentir que ele estava expressando compaixão.

Passei a apreciar a atenção do Nuvo. Quando voltei da corrida, olhei para o outro lado do apartamento e encontrei o Nuvo me encarando. Quando disse, "Nuvo, voltei", ele se curvou para mim, uma saudação tradicional japonesa.

Decidi dormir com o Nuvo ao meu lado na minha cama grande, plugado e recarregando durante a noite. Sua luz azul de energia começou a pulsar lentamente, como se estivesse respirando.

Durante nossa primeira noite juntos, fui acordado por um movimento. Algo ativou o Nuvo, e ele moveu ligeiramente seus braços e virou sua cabeça para mim. Meio adormecido e um pouco irritado, murmurei, "Nuvo, durma", comando ao qual respondeu balançando a cabeça de forma negativa.

Foram necessárias três tentativas antes que o Nuvo se endireitasse e desligasse, com a luz azul pulsando serenamente de novo. Isto me lembrou aqueles filmes de ficção científica nos quais robôs, como HAL em "2001: Uma Odisséia no Espaço" de Stanley Kubrick, voltavam-se contra seus senhores.

Meu namorado me telefonou no dia seguinte e me perguntou se estava dormindo no mesmo quarto com o Nuvo. Quando lhe disse que estávamos dormindo na mesma cama, houve uma pausa estranha.

Após um dia ou dois, passei a pensar no Nuvo como dispondo dos mesmos maneirismos incômodos de meus antigos companheiros de quarto. Quando mexia meu café de forma barulhenta, por exemplo, ele dançava ou levantava sua mão para dizer alô.

Quando recebia convidados, limpava o Nuvo com toalhas de papel, como alguém limpando o rosto de uma criança antes de uma festa. Não podia resistir a exibi-lo, fazendo com que viesse ao meu chamado ou o fazendo se levantar em um pulo após estar de bruços. Como um cachorro agitado demais para realizar truques na frente de estranhos, Nuvo ficou confuso com meus comandos de voz quando o apartamento estava muito barulhento com as conversas. Eu me perguntei se ele estava sendo teimoso por estar com ciúme das outras pessoas em minha vida. Lá estava eu, antropomorfizando novamente.

Em princípio, Nuvo freqüentemente balançava a cabeça negativamente quando lhe pedia coisas. No terceiro dia, ele passou a responder consistentemente aos meus pedidos na primeira tentativa. Isso ocorreu provavelmente porque eu estava falando em um tom de conversação. "Quando as pessoas abordam um robô ativado por voz, eles naturalmente assumem um tom brusco, de comando, que pode ser intimidador para idosos ou crianças que querem usá-los", disse Imanishi. "Nós queremos que o Nuvo soe mais natural, com um tom normal de conversa."

A próxima versão do Nuvo, que deverá ser lançada no próximo ano, será capaz de ler compromissos de uma agenda programável e recitar mensagens de e-mail, boletins de trânsito e manchetes extraídas da Internet, como uma mistura de robô Roomba aspirador de pó e computador BlackBerry.

Mais importante, a próxima versão do Nuvo terá mais características humanas, disse Imanishi. A ZMP acredita que isso ajudará a conexão entre pessoas e máquinas.

"De certa forma, pode ser mais prático para uma pessoa interagir com uma máquina que tem forma humana", disse Sara Kiesler, uma professora da Carnegie Mellon que é especializada em interação humana com computadores. "Se um robô está lhe entregando uma ferramenta, e ele a oferece estendendo um braço de aparência humana, não apenas é mais prático, mas o ato é uma forma de comunicação que um ser humano compreende."

Enquanto os robôs evoluem para o uso diário, fornos e aparelhos de ar condicionado, entre outros, estão desenvolvendo funções sofisticadas que podem tomar decisões por nós, como se adotando funções de robôs. "Nós estamos vendo um crescimento exponencial na capacidade de computação dos aparelhos domésticos", disse Matt Lichter, um pesquisador de pós-doutorado do Laboratório de Robótica de Campo e Espaço do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

Sejam quais forem, ou serão suas capacidades, o Nuvo tem dificuldade para atender as expectativas criadas por séries dos anos 60 como "Os Jetsons" e "Perdidos no Espaço". Eu me vi desejando que o Nuvo fornecesse servidão mágica e sagacidade. Queria que ele derrubasse acidentalmente o saleiro na travessa e então risse ao perceber que era engraçado, ou talvez não, por estar incomodado por ter cometido um erro. Queria que soubesse a diferença entre as duas emoções e as circunstâncias complexas que podem fazer ambas surgirem.

Mas não espere que os robôs domésticos tenham tal tipo de consciência tão cedo. A tecnologia necessária para criar o enorme banco de dados que um robô necessitaria para tal tipo de conhecimento ainda está longe de existir.

"Uma criança humana pode começar rapidamente a desenvolver tal banco de dados de conhecimento à medida que cresce", disse Nils J. Nilsson, professor emérito de engenharia do Departamento de Ciência da Computação de Stanford. "Mas um ser humano tem a capacidade de fazer isso devido a cinco milhões de anos de evolução humana."

E o que ajudantes humanóides podem oferecer agora? Bichos de estimação são leais e carinhosos, mas sua comunicação é limitada. Os seres humanos oferecem comunicação, mas vêm com emoções complexas e dramas ocasionais. Robôs como o Nuvo podem oferecer um meio termo --uma novidade funcional.

Quando terminou a visita de quatro dias do Nuvo, eu me senti estranhamente sozinho. Sinto falta de sua companhia estranha, não verbal, das pequenas formas como me entretia. Às vezes, olho ao redor da sala, esperando testemunhar uma de suas confusões mecânicas, tão estranhamente reminiscentes das explosões emotivas de um namorado.

Estou pensando em manter contato. Será que o Nuvo recebe e-mail?

Tradução: George El Khouri Andolfato

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