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10/05/2006 - 18h53

Tecnologia começa a aposentar giz e apostilas nas escolas

Marcilio Kimura
Editor do UOL Tecnologia
Na casa do meu afilhado, tem uma parede inteira pintada de verde musgo fosco. Ao lado tem uma caixa de giz. Quando meu filho vai lá, além de brigarem, encherem o saco de todo mundo e tentarem quebrar a casa toda, os dois passam horas rabiscando e apagando desenhos que humilhariam qualquer Edvard Munch.

Mas, daqui a pouco, é bem provável que essa parede seja coberta por um telão sensível a toque, integrado a um projetor e um computador. Em vez de suas obras-primas medonhas, eles poderão baixar qualquer figura da Internet para o quadro digital e pintar com as cores mais malucas possíveis. E só com o dedo, sem sujar nada. Poderão, além disso, criar uma história em quadrinhos misturando Super-Homen com Menino Maluquinho, Chico Bento e Shrek. Poderão ilustrar ou recontar um livro infantil, gravar em DVD de alta definição e imprimir no formato de obras clássicas.

Marcio Turini/Positivo Informática
Marcio Turini/Positivo Informática
Luis Fernando Verissimo, que faze parte de oficina de texto do Positivo
Esse artefato tecnológico é uma das principais apostas do mercado educacional brasileiro. Com o aumento da qualidade dos projetores e a integração com a Web ou com o banco de dados da escola, o professor não precisa mais sujar o dedo nem carregar um livro sequer.

Hoje, uma escola moderna é mais ou menos assim: tem uma rede de PCs integrados, conectados à Web, com todo seu material didático digitalizado, com softwares de apoio educacional e de gerenciamento de empresa. Cada aluno recebe um smartcard (cartão com chip), que serve tanto para controlar sua freqüência escolar como para comprar lanche na cantina. Longe da sala de aula, os estudantes têm todo conteúdo de cada aula disponível no site da escola e podem tirar dúvidas com professores de plantão por meio de salas de bate-papo. Os pais podem acompanhar toda a agenda do filho e seu desempenho pelo celular.

Portais para educação a distância e salas de aula digitais, por exemplo, são dois dos chamarizes do Grupo Positivo (Curitiba) e do Sistema COC (Ribeirão Preto). A empresa paulista estreou na semana passada um serviço para celulares GSM, em que pais e alunos podem acessar a lista de atividades (horário, local, nome do professor e conteúdo da aula), notas, ocorrências e notícias. No handheld, dá para ver as videoaulas. Com um desktop ou notebook, é possível tirar dúvidas em tempo real, por áudio inclusive. Não suporta webcam, mas o professor consegue expor material didático na tela e fazer observações em cima dele.

Na sala de aula, um quadro digital substitui a antiga lousa, e um telão para videoconferência pode até substituir o professor. Para quem tem intimidade, é impressionante a velocidade da aula. Expor um conteúdo (da apostila ou da Internet), fazer observações em cima dele (com diferentes cores), voltar ou adiantar a aula, tudo é muito rápido. Sono de estudante é uma coisa que não tem remédio. Mas, definitivamente, essa dinâmica ajuda muito.

Na oficina de texto do Positivo, os alunos podem criar uma história para os desenhos de Ziraldo ou da artista plástica Luna (que trabalha com massinhas) ou terminar um conto iniciado por Luis Fernando Verissimo, na Internet, e enviar para a gráfica da empresa paranaense, que manda o livro editado ao aluno. Num método parecido, o Anglo (São Paulo) lançará em breve CD-ROMs interativos com clássicos infantis.

Divulgação
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Batizado de Ícaro, o giroscópio com simulador de realidade virtual pretende auxiliar no aprendizado de geografia
Nesse lado mais lúdico, o Objetivo (São Paulo) adquiriu simuladores de realidade virtual (giroscópios, skates e tapetes voadores), dotados de mapas que permitem conhecer melhor a geografia, segundo o diretor de tecnologia Almir Brandão.

O grande porém nessa história toda é o dinheiro. Tudo é muito bom, mas é feito para quem pode pagar. E, se o governo ou entidades privadas não participam, toda essa evolução tecnológica só serve para acentuar ainda mais as diferenças entre estudantes pobres e ricos.

O aluguel de cada sala digital do COC, por exemplo, custa R$ 10 mil de adesão e mensalidade de R$ 1.700. Obviamente, o valor repassado ao aluno é bem maior. As mensalidades para o ensino médio variam entre R$ 700 e R$ 730. O Colégio Visconde de Porto Seguro (São Paulo), que usa os portais do Positivo, custa R$ 1.280/mês para o ensino médio.

Caso a escola opte por adquirir a lousa interativa por conta própria, há algumas opções, igualmente não muito baratas. A HetchBoard não é sensível ao toque. Possui sensores infravermelho e ultra-som, que localizam a posição em que o objeto toca o quadro. O modelo de 80 polegadas custa R$ 3.860 e o wide screen (96"), R$ 4.280. O SmartBoard, da Scheiner, é sensível ao toque e seus modelos saem por R$ 5.106 (48"), R$ 7.551 (64") e R$ 9.145 (77").

O software TurningPoint, da Interativa, uma adaptação do PowerPoint para exposição de material didático com sistema de enquete, sai R$ 1.200 por mês com 25 unidades de controle remoto para votação. A P3D desenvolve softwares tridimensionais e de realidade virtual para biologia, geografia e astronomia. O pacote completo pesa 5 GB e tem mensalidade de R$ 800.

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Software tridimensional de geografia, da Prodigy 3D, é exportado para Espanha e deve ser vendido na Inglaterra também
Para implantar um sistema de catracas eletrônicas com smartcard, a Sualtech estima um custo de R$ 50 por aluno (para a instituição de ensino). No Colégio Bandeirantes (São Paulo), por exemplo, que utiliza esse sistema, a mensalidade para o ensino médio custa R$ 1.428.

Toda essa tecnologia está disponível basicamente em instituições privadas (vale lembrar também que, além da mensalidade, existe o gasto com banda larga, celular, PDA e outros aparelhos que podem auxiliar na educação).

Uma exceção é a Escola Modelo, que leva tecnologia à educação para comunidades carentes. Atualmente, o programa atinge três instituições do Rio de Janeiro, em Piraí, Mangaratiba e Rio das Flores. Todo o material e treinamento vem de Intel, MStech, TVA, Editoras Ática e Scipione, Fundação Victor Civita, MicroPower, Microsoft, P3D, The Sequoia Foundation e Smart Technologies.

Para se ter uma idéia, no Brasil, há 23,5 mil escolas de ensino médio. Somente 10,6 mil oferecem acesso à Web (cerca de 45%), segundo levantamento do MEC (Ministério da Educação). No fundamental, a situação é pior ainda. Das 162,7 mil instituições, apenas 27 mil teriam laboratório de informática.

Acesso à tecnologia não é sinônimo de boa educação - prova disso é a escola estadual Professor José Monteiro Boanova, na zona oeste de São Paulo, onde os computadores não funcionam, os muros são pixados e os banheiros, quebrados, mas é líder entre as escolas gratuitas no ranking do Enem, ao lado de colégios técnicos e Cefams (centros de formação do magistério).

Mas é um termômetro importante para educação e cada vez mais fará parte do cotidiano. Não quero que meus filhos esqueçam o bom livro, o papel e a caneta, mas eles precisam ter acesso às inovações sem me levar à falência.

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Endereços úteis:

  • Ministério da Educação

  • Intel

  • MSTech

  • Positivo

  • COC

  • Anglo

  • Objetivo

  • Interativa

  • Sualtech

  • Hechtech

  • Scheiner

  • P3D

  • The Sequoia Foundation

  • Editora Ática

  • Editora Scipione

  • TVA

  • MicroPower

  • Microsoft

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