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É verdade que as empresas ouvem o que falamos para oferecer produtos?

Do UOL, em São Paulo

26/01/2018 04h00

Não adianta: por mais que as grandes empresas de tecnologia neguem, muita gente tem certeza de que elas ouvem nossas conversas 24 horas por dia pelos celulares. O mais recente exemplo disso foi um post do historiador e músico Tiago Porto que viralizou no Twitter e no Facebook, que dizia de forma bem humorada: "Quando quero pesquisar o preço de uma coisa agora eu só falo em voz alta e espero aparecer a propaganda no Instagram".


O Instagram pertence ao Facebook, que por sua vez é uma das redes sociais mais acusadas pelo público de burlar a privacidade, sugerindo anúncios de acordo com a nossa interação --o que vale para pesquisas e curtidas em páginas e posts, embora jure que não capta conversas por microfone.

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Postada na última segunda-feira (22), a mensagem de Porto já tem, até o momento, mais de 8.000 retuítes e 17 mil curtidas, além de uma captura de tela da mesma mensagem estar com 28 mil reações e 3.300 comentários no Facebook, pela página "Ajudar o Povo de Humanas a Fazer Miçanga".

Nos comentários, outras pessoas relatam experiências supostamente reais que comprovam a teoria.

"Um dia tava na porta do [da lanchonete] Subway, enquanto meu marido entrou pra comprar nossos sanduíches, fiquei no carro fuçando no Face... daí me aparece uma promoção do Subway", disse uma internauta. 

"Dá até pra mandar indireta, tipo: Certos aplicativos bem que podiam anunciar alguma brusinha em PRO-MO-ÇÃO", brincou outro.

Relatos assim são antigos. Em 2016, após uma conversa cara a cara com a mulher sobre os seus planos para o futuro, o escritor carioca Anderson França disse em uma postagem no Facebook ter sido surpreendido com propagandas em sua rede social relacionadas exatamente aos seus objetivos.


É real ou é viagem?

É real que serviços e aplicativos podem acessar a câmera e o microfone do seu celular, com o seu consentimento. Também é verdade que existem meios ilegais de obter esse acesso. Mas ninguém admite que usa essas ferramentas para espionar ou fazer marketing direto.

A maioria dos aplicativos que você usa pede permissão para usar certos componentes do celular, como lista de contatos, GPS, câmera e microfone, e muitas vezes esses acessos são necessários para que o serviço funcione por completo. Se, por exemplo, você proibisse o Instagram de acessar o microfone, seus vídeos filmados dentro do app jamais teriam áudio.

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Recentemente, foi descoberta uma ferramenta usada por hackers com funções assustadoras, como tirar foto quando você destrava o celular, rastrear a localização de um aparelho e ativar a gravação de áudio --tudo sem você saber. Chamada Skygofree, ela se parece com o Pegasus, um programa usado por governos para espionar cidadãos e que, inclusive, já foi usado para monitorar um dissidente político.

E, claro, não podemos esquecer de Edward Snowden, ex-técnico da Agência de Segurança Nacional americana (NSA) que denunciou a espionagem constante do órgão sobre pessoas e governos.

O UOL Tecnologia perguntou para Google, Apple e Facebook como eles usam esses acessos.

O Facebook nega que escute nossas conversas e diz que os anúncios são sugeridos com base nos interesses das pessoas e outras informações de perfil. O acesso ao microfone e à câmera acontece somente quando você usa ferramentas que requerem áudio e vídeo, e mediante permissão. 

O Google confirma que, conforme explicado nos termos de uso do serviço, grava os comandos de voz e usa os áudios para pesquisas internas, como o aprendizado de máquina do Google Assistente, que usa inteligência artificial para melhorar os produtos. Segundo a empresa, as informações não são usadas nem vendidas para fins comerciais, apenas para garantir a melhora do reconhecimento de linguagem. No entanto, o serviço permite que você acesse e apague todas essas gravações. Veja aqui como fazer

A Apple não se manifestou.

Sabemos que ouvir o lado das empresas, às vezes, parece não ser suficiente, especialmente com crescentes casos de crimes, truques e infrações envolvendo a quebra de privacidade.

O WhatsApp, por exemplo, sempre alega que usa criptografia --recurso de segurança que embaralha a mensagem e cria chaves para que elas sejam decodificadas apenar pelo destinatário final. Mas existem rumores mal explicadosexemplos de possíveis quebras dessa segurança, casos envolvendo WhatsApp Web aberto e até um golpe que usa um infiltrado na operadora de celularAté a CIA diz que nada é 100% seguro.

Dois especialistas ouvidos pela reportagem --Marco Konopacki, coordenador de projetos do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, e Lucas Teixeira, pesquisador e diretor técnico da Coding Rights, organização criada para contribuir com a promoção dos Direitos Humanos no mundo digital-- explicaram que os aparatos técnicos para ouvir as conversas existem, mas que eles não acreditam que sejam usados sem autorização.

Teixeira recomendou, porém, que você leia sempre os cansativos termos de uso dos apps e serviços web, pois eles podem conter autorizações de acesso --e, se você clicou no "ok", estará em tese de acordo com isso.