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14/01/2010 - 12h28

Queira ou não, a TV vira 3D

David Pogue

No final de cada temporada de “The Amazing Race”, o apresentador sempre diz algo tipo: “Cinco continentes, 14 países, 21 dias, 40 mil quilômetros. Vocês são os vencedores oficiais da ‘The Amazing Race’!”

Ao final da (feira) Consumer Electronics Show de cada ano em Las Vegas, ele realmente deveria estar lá no aeroporto para receber você: “Cinco dias, 2.500 expositores, 600 mil metros de espaço, 110 mil jornalistas e representantes da indústria. Você é um sobrevivente oficial da CES!”

E em vez de um milhão de dólares, ele deveria oferecer uma boa noite de sono, que, àquela altura, seria muito mais valiosa.

Todos ano, os membros das empresas de eletrônicos programam seus maiores anúncios de produtos para a CES e, todo ano, todos esses anúncios simultâneos anulam uns aos outros. Em vez de causar um grande impacto, eles são abafados no alarido.

E sem causar surpresa; em muitos aspectos, fora o surgimento da televisão 3D, os temas da exposição deste ano foram idênticos aos do ano passado. Telas de TV planas, grandes, brilhantes e finas. Design com consciência ambiental. Menor consumo de energia. Serviços de download (Vudu, Netflix, Amazon) já inseridos em mais aparelhos de TV e aparelhos de Blu-ray. Câmeras fotográficas, de vídeo, impressoras, laptops, aparelhos de Blu-ray, acessórios, equipamento de áudio, equipamento de home theater, telefones, eletrônicos para carros, todos incrementalmente melhorados.

Havia alguns itens novos. Um punhado de pequenas empresas apresentou leitores de livros eletrônicos, na esperança de tomar parte do mercado do Kindle/Nook/Sony Reader. Um punhado de empresas de informática anunciou planos para produzir pequenos computadores de mão Windows com tela de toque, para estarem prontos quando a Apple lançar o seu possível modelo de tela de toque. Ninguém parece lembrar que a Microsoft tentou vender esse conceito, na época chamado de Tablet PC, há poucos anos e fracassou.

A maior notícia de todas, entretanto, foi a explosão do interesse na televisão 3D. Isto é, interesse pelas empresas que as estão produzindo. Se as pessoas comuns terão algum interesse é a grande pergunta.

Na CES, se você ficasse tempo suficiente na fila, você podia assistir protótipos de telas de TV 3D nos estandes da Sony, Samsung, Toshiba, LG e Panasonic. (“Estande” pode não ser a palavra exata para os enormes minimundos milionários, do tamanho da metade de um campo de futebol, construídos pelas grandes corporações dentro do Las Vegas Convention Center.)

Se você já viu um filme em 3D — “Avatar”, “Up”, “O Expresso Polar” e assim por diante — então você já viu o efeito. Você usa óculos de plástico e tem a sensação de profundidade na imagem do filme. Às vezes o cineasta apela ao fazer o personagem espetar uma vara “para fora da tela”, quase no seu rosto; em outras vezes, como em “Avatar”, o efeito 3D propicia uma profundidade mais sutil e realismo à cena.

Na CES, as telas eram grandes, as imagens eram de alta definição, os sistemas de som eram de última geração e os vídeos de amostra eram vívidos. Elas faziam a TV 3D parecer fantástica. Você mal podia esperar para comprar uma quando forem lançadas em meados deste ano.

Mas assim que os óculos eram recolhidos para o próximo cliente, você seria perdoado se tivesse algumas dúvidas.

Primeiro, os óculos. Eca. Nós realmente queremos usar óculos toda vez que quisermos sentar para assistir TV? Nós não perdemos algo quando olhamos ao redor na sala para trocar olhares, sem poder ver os olhos dos outros? Nós realmente queremos nos aconchegar com nossas noivas e esposas usando essas coisas?

Você receberá um ou dois óculos com cada televisor. Óculos adicionais custarão US$ 75 ou mais. Se você convidar 12 amigos para assistir um jogo de futebol, para estrear sua cara TV 3D nova, você terá que desembolsar US$ 750 apenas para que todos possam assistir ao jogo.

(E não, você não pode pedir aos amigos que tragam seus próprios óculos. Os fabricantes de TV não conseguiram chegar a um acordo quanto ao formato, de forma que os óculos de um fabricante poderão não funcionar na TV de outro. Argh.)

Os óculos inclusos nestes aparelhos modernos são muito diferentes daqueles velhos óculos de papelão dos cinemas. Os óculos atuais usam algo chamado de tecnologia de obturador ativo, na qual as lentes ficam escuras e então clareiam de novo, realmente rápido, em sincronia com as imagens do olho direito e olho esquerdo que se alternam na tela da TV.

Mas os óculos com obturador ativo são alimentados por bateria. Dá para imaginar? Você se senta para assistir ao último capítulo da novela e, ouve, da cozinha: “Querida, lamento — eu esqueci de recarregar os óculos na noite passada!”

Nem o 3D é uma bênção para tudo o que se assiste na TV. Ele beneficia principalmente esportes, concertos, videogames e, é claro, aqueles filmes de animação em 3D que, até agora, exigiam a ida ao cinema.

(É incrível que Hollywood esteja apenas esperando, observando a indústria da TV tramando atrair o público do cinema de volta para casa. A ideia por trás da recente febre de filmes em 3D não era tirar as pessoas de frente da TV e levá-las de volta aos cinemas?)

Por outro lado, seria difícil imaginar você querendo usar esses óculos para assistir o noticiário, programas de entrevistas, game shows, sitcoms, programas de culinárias, programas de decoração e programas educativos.

O que traz outra preocupação: o que vamos assistir?

Se a resposta é filmes, então você terá que comprar não apenas um novo televisor, mas também um novo aparelho Blu-ray 3D. E, é claro, você terá que recomprar todos seus filmes de novo, ou pelo menos os 3D.

Se a resposta é: “Eu vou assistir programas de TV 3D”, bem, você terá que esperar muito. Vários canais 3D foram anunciados (pela ESPN, DirecTV e um joint venture da Sony, Imax e Discovery). Mas conte com muita reprise, pelo menos no início; ainda não existem programas 3D e a filmagem deles exige câmeras de TV de lente dupla, pesadas e caras.

Nenhuma dessas transmissões será em alta definição, a propósito. Uma transmissão em 3D exige muito mais dados do que um canal regular de alta definição; ela não caberia na mesma largura de banda a menos que fosse sacrificada parte da informação da imagem. Como resultado, as transmissões 3D por cabo, satélite e Internet oferecerão apenas metade da resolução (clareza) da TV de alta definição. Apenas os aparelhos Blu-ray produzirão imagens 3D em alta definição plena.

Finalmente — e isto é importante — nós não acabamos de passar por isso? Os fabricantes de TV e emissoras não acabaram de arrastar a população para uma transição cara e confusa de nosso velho sistema de TV para a nova era de alta definição e tela plana? Nós não acabamos de comprar novos aparelhos de TV digitais, aparelhos Blu-ray e filmes Blu-ray, acreditando que estaríamos tranquilos pelo menos pela próxima década?

E agora descobrimos que teremos que recomeçar tudo de novo — comprar um novo televisor, um novo aparelho Blu-ray, novos discos — para acomodar este novo formato?

Eu acho que existe algo como Fadiga de Atualização, meus amigos, e acho que a indústria de TVs está prestes a se deparar com ela.

Bem, os defensores do 3D dizem que esses televisores funcionarão igualmente bem como televisores comuns para tudo o que já assistimos na TV. De forma que você não ficará na mão em caso de fracasso do 3D. Eles nos encorajam a pensar nos televisores 3D como TVs comuns de alta definição, apenas com uma opção extra. De fato, alguns serão vendidos como “prontos para 3D”, o que significa que você poderá acrescentar os óculos e transmissor depois.

Mas tenha em mente que a próxima geração de tecnologia de TV também estava em exposição na CES: aparelhos 3D que não precisam de óculos. No momento, eles oferecem baixa resolução, limitação de ângulos para assistir e imagens indutoras de dor de cabeça. Mas eles melhorarão. E daqui alguns anos, eles estarão prontos.

Isso, sem dúvida, acontecerá logo após descartarmos nossos televisores de alta definição de cinco anos, comprando as telas 3D de obturador ativo que estavam em exposição na CES deste ano.

Tradução: George El Khouri Andolfato

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